A gente acredita que é preciso vender um rim ou fazer das tripas coração pra dar o melhor pra esses seres pequeninos que a vida nos trouxe. Acha que é preciso trabalhar dia, noite e madrugada pra dar conta de dar a eles o que há de melhor. E como essa é uma meta inalcançável, frequentemente somos assoladas por frustração ou desapontamento com a gente mesmo. Adoecemos. Cansamos. Muitas vezes sem perceber que nada disso é necessário… Que o que de mais importante as crianças precisam é de colo, carinho, respeito, segurança. Segurança material sim, também, como não? Mas nem de longe isso está no topo da prioridade. Mais vale uma criança emocionalmente forte e sadia pois que recebeu amor, respeito e atenção que segurança material oferecida às custas de abandono emocional, ausência e descaso.

Aqui em casa temos uma tradição deliciosa: assistimos juntas a filminhos em manhãs chuvosas de sábado. É um momento especial, justamente porque acontece numa casa em que a TV é acessório dispensável e quase não utilizado, ou destinado apenas a filmes em momentos muito específicos. 

Hoje ela estava ali, sentada no sofá, tomando o café da manhã muito simples que preparei pra ela. Olhei aquela cena e senti uma ternura imensa por tê-la ao meu lado e poder proporcionar isso: quietude, tranquilidade, pãozinho, cobertor. Uma cena tão simples, cheia de significado tão intenso: uma criança amada, em ambiente tranquilo, tomando seu café da manhã. É inevitável, para mim, pensar que não é uma cena frequente. Que há lares onde o ódio é alimentado desde a mais tenra juventude, onde palavras agressivas são ditas às crianças, onde a cinta está pendurada na maçaneta, onde a televisão está ligada como som de fundo para preencher o vazio das relações entre pessoas que nem sabem o que estão fazendo ali… Ou onde há, no momento, tanta dor que a vida sequer consegue ser vivida…

Ela está ali, sentada, tranquila, coberta, enquanto eu reflito sobre toda a desigualdade que existe, sobre como tantas vezes isso não é possível para tantas mulheres, sobre como há lares onde a violência é o tom, a rotina, o normal. Sobre como uma mãe pode sofrer a ausência de um filho… Mas isso não me deprime: isso me motiva a falar sobre isso em qualquer lugar que vou, a lutar por mais crianças e suas mães vivendo vidas mais tranquilas e amorosas. Essa cena me inspira e me motiva a não passar batido por essa existência. Muito menos pela existência deles e delas: nossos filhos. Porque no fim, o que eles levarão de nós é justamente a memória e o amor de manhãs tranquilas de sábado. Ou de uma vida onde o afeto esteve presente todos os dias.

Porque é preciso olhar pra esses seres com afeto, como respeito. Mas também é preciso lembrar de quem não está aqui dentro. Das mulheres, suas dores, suas crianças e suas vidas. E também dos que não estão mais.

Era só uma criança quentinha comendo um pãozinho no sofá enquanto assiste a um filminho.

E de repente se transforma num mundo que precisa de cada um de nós para seguir em frente com menos desamor…

Às vezes, esse é o convite que a chegada dos filhos nos faz.

E que a gente pode aceitar. Ou não.

Esse texto é uma singela homenagem a mães que vivem talvez a dor mais funda que uma mãe pode viver.

E todas estamos sujeitas a ela…

Meu amor e mais sincero respeito a todas vocês.

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Parte do meu trabalho é apoiar mulheres nas mais diferentes questões das suas vidas: maternidade, educação sem violência, empoderamento, fortalecimento, carreira profissional, desenvolvimento científico. Sou Mestra em Psicobiologia pelo Departamento de Psicologia e Educação da USP, Doutora em Ciências/Farmacologia pela Universidade Federal de Santa Catarina e Doutora em Saúde Coletiva também pela Universidade Federal de Santa Catarina, com foco na saúde das mulheres e das crianças. Se você precisa de apoio e orientação, mande um e-mail para ligia@cientistaqueviroumae.com.br que eu te explico como funciona a MENTORIA E APOIO MATERNO.