Esse post faz parte da blogagem coletiva junto com o pessoal da Rede Mulher e Mãe, sobre o tema AVÓS.

No dia 23 de novembro de 2010, tive o mais incrível susto que eu poderia ter na vida.
Às 15 horas da tarde, vi pela internet o resultado de um monte de exames que havia feito para investigar a causa de uma tontura que me acompanhava há uns cinco dias…
Resultado negativo para anemia, resultado negativo para alterações da tireoide, resultado negativo para diabetes.
Resultado positivo para gravidez!
Naquele dia nascia uma mãe. E naquele dia, nasciam dois avós. Meu pai e minha mãe.
Digo “nasciam” porque o meu bebê, que até então não sabíamos que seria a Clara (que dorme aqui do meu ladinho, enquanto escrevo esse post), era, até então, o primeiro neto deles.
Se era surpresa para mim, imagine para eles…
Algumas horas depois do resultado, liguei para meu pai e disse: “Tenho uma coisa pra te dizer, véio. Você vai ser avô”. Assim, à queima roupa. Ele ficou mudo. Depois me perguntou: “Você tá brincando?”. E eu: “Vai, pai, vai ser vovô. Tô grávida!”. A reação? Deu uma gargalhada, depois deu uma choradinha, depois deu uma gargalhada e assim por diante… Logo depois, me ligou novamente, e começou de novo. Estava muito feliz com a novidade!
À noite, eu e o namorado passamos na casa dele para ganharmos um abraço – como novos pais – e para dar um abraço ao novo vovô. E celebramos juntos as novas alcunhas – pais e vovô.
Nesse dia, fazia 2 anos e 8 meses que eu e minha mãe não nos falávamos… Estávamos distantes uma da outra durante todo esse tempo. Tempo de grande sofrimento e vazio pra mim. Não houve, nesse tempo, um só dia em que eu não pensasse nela e não sofresse por termos nos desentendido. Sentia sua falta em cada acontecimento importante da minha vida, em cada dia de sol e em cada dia nublado – nos dias nublados ainda mais… Sentia falta dela e de tudo o que ela representava na minha vida, das nossas semelhanças e das nossas diferenças. Foram dias tristes, aqueles…
E naquele dia em que soube que estava grávida, deixei tudo de lado e pensei: chega disso. Podíamos ficar sem nos falar mais um tempo, caso fosse a vontade dela, mas eu queria que ela soubesse que, depois de tantas perdas familiares dolorosas, estava chegando alguém que era nosso.
Da casa do meu pai, eu liguei para ela.
Ela atendeu. E antes que desligasse, eu disse rápido: “Mãe, sou eu, preciso falar com você, pode falar comigo?”
E ela disse: “Pode falar…”.
E eu: “Você vai ser vovó…”
Se eu estivesse escrevendo sobre um papel, já teria uma pocinha aqui, de tanto que choro lembrando desse dia… Ainda bem que o teclado está longe do rosto, senão me eletrocutava agora.
Lembro-me que se seguiu um silêncio. E na sequência, lembro-me dela perguntar se era verdade mesmo. E eu confirmando.
E foi assim que eles souberam que seriam avós.
Mas não foi aí que se tornaram avós. Foram se tornando avós ao longo dos 9 meses das nossas gravidezes. Gravidezes assim, no plural, porque dois meses depois, Lenita, minha irmã caçula, descobria (enquanto tinha vindo a Floripa me ajudar, em função de um forte sangramento que tive) que também estava grávida!
E foi assim que eles se tornaram avós duas vezes, de uma só vez.
Meu pai esteve fisicamente ao meu lado durante os 9 meses, me ajudando e fazendo o possível (e em algumas vezes até o impossível) para que não me faltasse nada. Dando carinho e colo. Passou os 9 meses selecionando, entre a coleção infinita dele de CDs e bolachões, quais músicas seriam dedicadas à Clara. Hoje tenho aqui uma sacola com CDs com essas músicas, que ela ainda não começou a ouvir. Sempre que falava comigo, falava com minha barriga, que era “Para ela ir se acostumando com a voz do vovô”, segundo ele mesmo dizia. Perdi as contas de quantas vezes eu o ouvi dizer “Logo mais, ela estará correndo aqui”. Não sei se foi coincidência, mas ela sorriu para ele na primeira vez que se viram, talvez lembrando da voz…
E minha mãe?
Bem, ela continuava longe de mim fisicamente. Porque moramos há muitos quilômetros de distância.
Mas aí a vida, que é essa coisa doida e imprevisível, aprontou uma outra. Minha avó, uma portuguesa querida e turrona de 85 anos, estava se preparando para partir, sem nem dar aviso prévio.
Mesmo grávida e tendo enfrentado dois sangramentos e um repouso, passei a mão no carro e dirigi 700 km pra estar com minha mãe naquele momento. Fui, mas não tive coragem de encontrá-la imediatamente. Esperei minha intuição apitar e, quando ela apitou, corri para vê-la. E naquela noite ouvimos, juntas, a notícia de que minha avó havia partido… Eu estava com 4 meses de gravidez e ela partiu me deixando órfã de avós. E de padrinhos. Ela, que era a última deles a estar aqui com a gente. Não conseguiu ficar tempo suficiente para ver minha filha nascer…
Mas daquela morte nasceu uma vida nova. A minha nova vida com minha mãe. Não sei se por causa da morte da minha avó, do nascimento da minha filha ou dos nossos próprios renascimentos como pessoas mais experientes e maduras, nasceu uma nova relação. Uma relação nova sobre um amor antigo.
Ela quase não me viu barriguda pessoalmente, em função da distância e das coisas da vida. Mas esteve presente em tudo. Quase pariu comigo quando eu estava “parindo”, de agonia. E está por dentro de tudo o que anda acontecendo com a Clara.
Ontem ficamos horas nos vendo e nos falando com o auxílio de uma câmera – essa tecnologia milagrosa… E a Clara ouvindo a voz dela. Elas ainda não se encontraram pessoalmente. Também em função da distância e das coisas da vida que já mencionei. Mas já existem uma no coração da outra de maneira indelével.
Agora estamos todos na torcida para irmos para a casa dela passar o final do ano juntos.
E eu não sei o que será de mim quando elas se apresentarem pessoalmente uma à outra.
Não sei se ficarei de pé quando eu disser para minha filha: “Filha, essa é a sua vovó…”.
Espero que o namorado esteja ao meu lado nessa hora, com um lençol para secar as lágrimas todas que vão jorrar…
Porque tem uma coisa: todas nós temos sangue português e somos, de um jeito ou de outro, portuguesas. E portuguesa choooooooora que é um drama. Não foi à toa que Camões disse aquele lance lá de “Ó mar salgado! Quanto do teu sal são lágrimas de Portugal”.
Minha avó, que se foi, se estivesse aqui, não me deixaria mentir…
Eu mesma não me deixo mentir…

Dedico esse post e tudo de bom que eu senti enquanto o escrevia a quatro avós mais que especiais: Cesário e Alice, meus avós tão amados, que se foram e de quem sinto tanta falta.
E Lau e Fátima, os avós da Clara. Meus pais. Meus amigos. Que ajudaram a construir essa coisa doida – mas do bem – que eu sou hoje.
Lá em cima, os avós da Clara, meus pais. Há muitos e muitos anos. Talvez, até, em outra encarnação, tamanha mudança de contexto que houve…

Aqui embaixo, os meus avós, no meu batizado (ao lado da minha mãe, me segurando).

Um comentário só, para passar esse tom melancólico: que bom que a moda daquela época mudou, né minha gente?
Porque meu pai, com aquele bigodinho e cabelinho Charles Bronson, não dá né?
Agora, o vinco na calça do meu avô tá de fazer inveja aos que tem TOC… benza Deus.

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