Um portal de notícias conhecido publicou recentemente uma matéria com 10 dicas para escolher a melhor maternidade para dar à luz.
Ao começar a leitura da matéria eu tinha a esperança (juro!) de ler entre as 10 sugestões, de preferência entre  as primeiras, coisas bastante relevantes, como:

1 – verifique as taxas de cesárea da instituição de saúde e não aceite justificativas de qualquer tipo para taxas elevadas
2 – certifique-se de que valorizam o parto humanizado e o protagonismo da parturiente
3 – certifique-se de que, caso você assim desejar, permitam a entrada da doula
4 – entre outras coisas tão importantes quanto e que andam sendo tão discutidas, tão valorizadas nos dias atuais, marcados por marchas, movimentos e pelo avanço do “movimento da contracultura” do parto (ouvi essa esses dias e me senti super hippie, comecei a cantar Aquarius na hora), que valoriza o protagonismo feminino, o respeito ao parto e nascimento e tudo mais que temos discutido tanto nas ruas, nas mídias sociais, na grande mídia.

Ok. Confesso que tenho tendência ao alto grau de esperança no mundo e às vezes jogo o “Jogo do Contente”.
Tudo bem, eu sei que,  considerando que as dicas foram dadas pela diretora administrativa da Febrasgo (Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia), Vera Fonseca, que é contra o parto domiciliar e anda por aí apavorando mulheres, não seria uma missão tão fácil. Mas a instituição da qual ela faz parte se posicionou CONTRA as resoluções do Cremerj, afirmando, na voz de seu presidente, Etelvino Trindade, que a mulher não só tem o direito de escolher onde e com quem deseja dar à luz como também que o parto domiciliar em gestações de baixo risco é seguro, que deve ser um direito assegurado às mães, se assim desejarem, e que os médicos devem ter o direito de atenderem esses partos, se assim também quiserem. 
Então, pensa bem, não era assim tão utópico esperar que coisas realmente importantes estivessem no topo da lista porque, afinal, conta-se com o bom senso das pessoas.
Mas realmente não foi nada disso… o que mostra claramente que aqueles que se apresentam como “os mais entendidos da área” podem mais prejudicar que auxiliar, na dependência da postura que adotam.
Veja agora quais foram as 10 dicas:

1 – Ouvir a opinião do obstetra
Por favor, música de “Psicose”, o filme, para esse tópico.
TÃ TÃ TÃ TÃ.
Medo.
Por que medo?
Porque se o obstetra for da turma do bisturi, do sorinho, da episiotomia, da aceleração do trabalho de parto, da circular de cordão como malfeitor do bebê e todas aquelas coisas que já sabemos, a escolha da maternidade será, com certeza, feita em função de permitir suas práticas abusivas e não favorecer e incentivar práticas respeitosas e humanizadas. Entra aí, portanto, a importância imensa de bem escolher o obstetra, muito ANTES de se pensar na maternidade, a fim de fugir do obsTREta cheio de “o bebê é grande”, “tá passando da hora”, “tem circular de cordão”.

2 – Avaliar se a maternidade tem plantonista obstétrico
A justificativa para essa dica é baseada, unicamente, no discurso do risco: “Se a grávida tiver alguma complicação, o ideal é que exista um obstetra no hospital pronto para atendê-la“. Depois desse tópico, esse negócio de dar à luz está me parecendo muito perigoso…
Acho que não vou tentar de novo.
Vai que eu morro?

3 – Conferir se há UTI adulto no local 
Algumas complicações (…) podem levar à necessidade de tratamento em uma unidade de terapia intensiva“. Não sou nenhuma ingênua e sei que existem casos de gravidez de alto risco, que necessitam cuidados especiais e uma equipe muito bem preparada. Mas é importante ressaltar que a GRANDE maioria das gestações é de baixo risco. Então, claro, é importante que uma maternidade possa oferecer segurança às parturientes. Mas não seria mais importante enfatizar os recursos dos quais dispõe de forma a tornar aquela experiência saudável, inclusive emocionalmente, ao invés de focar no risco, risco, risco, risco?
Qual o objetivo disso? Instaurar definitivamente no inconsciente feminino o risco do parto?!

4 – Não se esqueça da UTI neonatal

É um dos principais argumentos dos que são contra o parto em casa: “Se acontece alguma coisa com o bebê, não tem uma UTI por perto”. Esse medo de que aconteça alguma coisa com o bebê acompanha o imaginário e o não imaginário humano desde que gente é gente.
Eu também sou a favor de se garantir a segurança do bebê. Mas não acho que isso passe exclusivamente pela presença de uma UTI neonatal. Os hospitais campeões em taxas de cesárea (muitos deles com nomes de Santos, inclusive, o que é uma ironia…) orgulham-se de suas UTIs neonatais. Mas eles precisam MESMO ter porque, afinal, o número de bebês prematuros que tiram das barrigas saudáveis de suas mães é imenso, a chance de precisarem de cuidados intensivos é mesmo grande, há que se dizer.
Não sou contra a UTI neonatal, não tenho porque ser.
Apenas acho que estamos escolhendo maternidades para mulheres em grande risco, gestantes de bebês também em grande risco, e não para mulheres saudáveis. Enquanto perdurar esse discurso, muita coisa vai continuar a acontecer. Que existam UTIs neonatais, mas que isso não seja um fator mais importante que a possibilidade de ter um acompanhante ao seu lado (sim, porque estamos na 4a. dica e não se falou nisso ainda) ou de oferecer um tratamento respeitoso e humanizado ao nascimento (coisa que nem se menciona).

5 – Saber se há banco de sangue e exames complementares
Um banco de sangue no próprio hospital facilita no caso de a mulher ter uma hemorragia no parto“.
Definitivamente… Se a mulher estiver avaliando a possibilidade de engravidar, desistiu e foi ver tv.
É possível que tenhamos uma ou duas leitoras que tiveram hemorragias no parto e que bradarão a importância do banco de sangue. Mas eu acho que já deu pra entender sobre o que estou falando, não? Sinceramente, não sei até hoje se o hospital para o qual eu fui transferida na minha tentativa de parto domiciliar tinha banco de sangue. Isso nunca esteve entre minhas prioridades de conhecimento durante a gestação. Apenas porque eu encaro a gravidez como um exemplo de vida, não de morte.< br />“Mas vai que…”.
Mas vai que nada. Recuso-me a viver na eminência da desgraça. Mas… é uma opção e muita gente decide viver assim. Coitado desse filho.

6 – Visitar a maternidade antes do parto 
Taí. Gostei. Nem devia vir em sexto lugar, devia vir mais lá em cima, antes das dicas amedrontadoras. Visitar a maternidade é importante – se você quiser ter seu filho em uma, é claro… Veja se há alojamento conjunto, se os bebês são retirados da mãe, se há quartos para partos humanizados, se há (ui, credo…) berçários (se houver, acenda seu alarme vermelho e fuja para as montanhas), se há apenas um banheiro para 12 mães na enfermaria ou se há melhores condições que isso, se os banheiros estão limpos, se tem acompanhante com mães naquele momento. Seja crítica. Você não está buscando um hotel, está buscando o local que seu filho olhará pela primeira vez, está buscando um lugar para ser respeitada num momento especial.

7 – Verificar a qualidade da equipe.
EM SÉTIMO LUGAR?! Pôxa, Vera…
Não vou nem comentar.

8 – Constatar a segurança da maternidade
Ainda na visita, a mulher pode prestar atenção na segurança conferida pela maternidade. Além de ter o controle das pessoas que entram e saem do edifício, o diretor técnico deve ter a responsabilidade de avaliar se as pessoas que trabalham na unidade são de confiança”.
Sou de outro planeta mesmo…
Se eu suponho que meu filho não sairá do meu lado sequer um momento, e que é uma instituição que trabalha com saúde, com mulheres em trabalho de parto (que assim seja!), com famílias e crianças, deve estar implícito que houve uma seleção criteriosa dos funcionários e que não há riscos… OU NÃO?! Me diga que sim, para que eu mantenha a fé no mundo.
Se eu tivesse lido esse tópico antes da gestação, teria me tornado ativista pelo parto domiciliar antes mesmo de ser mãe. Porque, afinal, na casa da gente entra só quem a gente quer, quem a gente ama e em quem a gente confia.
Não sei… mas acho que minha fobia de hospital voltou…

9 – Listar as maternidades do convênio
O parto e os custos de uma maternidade privada podem pesar demais na conta já alta da grávida. Para evitar surpresas, a mulher deve verificar se a maternidade pretendida consta na cobertura do seguro de saúde, incluindo serviços adicionais, como a anestesia. Quem fez o acompanhamento pré-natal pelo SUS deve procurar saber para onde será encaminhada e visitar o local antes“.
Boa dica, essa. Veja, também, se o plano que você possui é compatível com o alojamento que a maternidade pretendida dispõe, porque tem essa também.
Achar que tem o alojamento que seu plano cobre, não ter, e na hora H ter que deixar o bebê como pagamento não vai ser bacana… Isso, claro, se você tiver um plano de saúde (mas parece que o texto foi escrito para quem tem, notou?).

10 – Conferir algumas opções adicionais
Ok. Xinguei, nesse ponto.
“Alguns confortos extras podem ser levados em conta, como o tamanho e a qualidade das instalações do quarto, mas a mulher deve se lembrar de priorizar outros fatores e serviços mais importantes. Um deles é a permissão da presença de um acompanhante na hora do parto, recomendada pela Organização Mundial de Saúde. ‘Está mais que comprovado que o acompanhante da família ajuda o trabalho de parto’, afirma Vera.
EM ÚLTIMO LUGAR VEM O ACOMPANHANTE?!
E eu não gostei da ênfase ao “da família“, que fique registrado.

Como pode ser observado, não há qualquer menção à questão do hospital ser comprometido com o respeito ao parto como evento fisiológico, do incentivo à amamentação na primeira hora de vida, do bebê ficar todo o tempo junto à sua mãe sem ser afastado dela, da verificação dos procedimentos que serão feitos com o bebê, da taxa de cesárea (que já mencionei), da autorização para entrada da doula ou até mesmo se o hospital dispõe de uma (alguns já dispõem), do comprometimento da instituição com a humanização do parto.
Essas são coisas imprescindíveis que devem ser lembradas em primeiro lugar se você estiver buscando uma experiência de parto respeitado, bacana, física e emocionalmente saudável. Mas, claro, tudo tem a ver com a forma como você encara esse evento tão especial. As quatro primeiras imagens deste texto não têm absolutamente nada a ver com o que eu penso sobre o nascimento de um filho.
Pra finalizar, deixo aqui o vídeo em que o presidente da Febrasgo fala sobre a posição da instituição contra as resoluções do Cremerj. Vale a pena assistir, basta clicar na imagem.
E eu confio no mundo.
Sei que as mães não vão dar bola pra essas dicas apavorantes e terão outras prioridades.
E não se atreva a me dizer que não é assim, não…
Me deixa ter fé na vida, fé no homem, fé no que virá.

O texto da imagem de abertura é meu, em ilustração editorial de autor que não encontrei o nome.

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