Hoje, às 14:15, eu e o pai da Clara paramos um minuto o que estávamos fazendo (no meio do
supermercado) e nos abraçamos. 
Fazia 1 ano que eu entrava em trabalho de parto…

No ano passado, no momento em que eu escrevo aqui, eu estava há 6 horas em trabalho de parto. Absolutamente pronta para o que viesse pela frente.
Não sabia que ainda faltariam 25 horas, que enfrentaria uma maratona, mas isso também não me assustava. A dor não me assustava. Eu estava preparada. Estava pronta. Simplesmente porque me preparei para isso, psicologicamente falando, emocionalmente falando.

Há 1 ano, estávamos em trabalho de parto em casa.

Todo mundo fala muito da dor do parto. Mas poucos falam tão declaradamente da maravilha e do encantamento que é sentir que seu filho está há algumas horas de chegar. Ele está pronto. Está no tempo dele. Ele quer vir. Está sendo massageado pelas contrações uterinas, que tem essa função mesmo, massageá-lo enquanto o impulsiona, preparando o corpinho para a vida, como dizendo: “Chegou a hora, amigo, vamos lá. Se espreguiça que a vida lá fora está de braços abertos pra você! Vai!“.

Dor e sofrimento não são sinônimos.

Dor é uma coisa. Sofrimento é outra.
Mas não é todo mundo que para pra pensar sobre isso…
Muitos acham que toda dor é sofrida.
Dor é uma manifestação subjetiva, fisiológica, natural.
Sofrimento é o conteúdo que se atribui a qualquer situação, inclusive uma dolorosa, mas não é inerente à dor.
E isso fica muito claro no trabalho de parto.

Vivemos numa sociedade que adquiriu verdadeira fobia, completo pânico, absoluta aversão à dor. E isso tem gerado doenças e problemas os mais diversos: dependência de drogas de abuso; desvios de comportamentos; jovens absolutamente despreparados para a vida; gente deprimida; todo tipo de coisa que visa EVITAR A DOR a todo custo.
A dor não é mais tolerada.
Rápido se lança mão de artifícios para impedi-la.
Com isso, perdemos a insubstituível oportunidade de aprender mais com ela, de conhecer nossas capacidades, de desenvolvermos novas habilidades.
A dor ensina, a dor faz crescer, a dor existe por um motivo, que não é  gerar sofrimento.

Durante as 29 horas que estive em trabalho de parto, senti uma dor que de sofrida não tinha nada. Era uma sensação de “alcançar”, de “estar apta”, de “fim de ciclo”, de “missão cumprida”. Cada contração foi interpretada por mim como “um passo a mais em direção à minha filha”. Cada uma que vinha me deixava mais próxima dela. Peguei-me, inclusive, muitas vezes pedindo para vir a contração, entre uma e outra. Terminava uma, eu respirava fundo, me esticava, caminhava, me movimentava e pensava “pode vir a próxima”. Era a Clara que estava vindo, como não querê-las?

Então hoje, que completa 1 ano que minha filha começou a atravessar a linha fronteiriça do mundo de lá, agradeço à vida por ter podido entrar em trabalho de parto, porque isso a preparou melhor para a vida, com toda certeza. Se assim não fosse, as contrações simplesmente não existiriam mais na história biológica humana. Se existem, é porque são necessárias.

Amanhã, 30 de julho, Clara completará 1 ano de vida. De uma vida incrível!
Ontem (quer dizer, hoje) fui dormir às 5 da manhã preparando as coisas pro aniversário dela, que será uma festinha craft, cheia de coisas feitas à mão.
Eu decorei mais de 100 fotos em diferentes ampliações que retratam esse 1 ano de vida dela.
Foi um trabalho muito emocionante.
Cada foto que eu olhava me trazia o sentimento da época.
Eu e o pai dela juntos em trabalho de parto, ela recém nascida, ela bem pequenininha, ela crescendo e engordando, ela comendo pela primeira vez, o primeiro dentinho… Foi uma viagem intensa a momentos importantes desse 1 ano.
Mas não são os momentos mais importantes. Esses não foram fotografados.
Na calada da noite, uma mãozinha no meu rosto. Na amamentação, um sorriso. Um abraço amoroso. Um olhar de entrega. A expressão de que somos tudo o que ela precisa ter.

Não há nada que eu possa falar que resuma satisfatoriamente o que eu sinto, porque as palavras são artifícios muito limitados frente a alguns tipos de amor. Então deixo, nessa véspera de aniversário de 1 ano da minha filha, um recado para todas as gestantes e mulheres que ainda querem ser mães:

NÃO TEMAM A DOR. Qualquer que seja ela. 

Outro dia ouvi de uma pessoa que ela não queria ser mãe nunca para não sentir dor. Ela se referia tanto à dor do parto quanto à dor das coisas da vida, a sofrimentos possíveis.
Quem teme a dor do parto apenas não a entendeu ainda.
Ela não é sofrida. Ela é conquista.
Ela te abre não lá embaixo. Ela te abre aqui no peito, pra vida que vem vindo.

Quem vive evitando a dor não está vivendo. Quem não sente dor já está morto.

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