Ontem, dia primeiro de janeiro de 2011, como todo brasileiro sabe (ou deveria saber), uma mulher assumiu o governo do país. Sem apologias ou contra-apologias à senhora Dilma Rousseff, estou muito feliz por isso.

Não votei na Dilma, porque afinal justifiquei; mas mesmo que tivesse tido a oportunidade, não seria dela o meu voto (nem do Serra, aquele pobre ser). Mesmo assim estou feliz por isso. Vi algumas partes da cerimônia de posse e me emocionei. Hipocrisia? Não. Consciência histórica brasileira. Uma mulher presidente do Brasil é, sim, algo muito emocionante, pelo menos para quem é mulher com algum tipo de consciência política (nem precisa muito, vai…).

Há 80 anos atrás, nem votar uma mulher podia nesse país. Aí, em 1927, uma mulher, professora, chamada Celina Guimarães foi a primeira mulher a votar, na cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte, estado pioneiro nisso. Mas era uma decisão regional e foi apenas em 1932 que o Código Eleitoral Provisório deu direito de votos às mulheres. E, ainda assim, um direito manco: só viúvas e solteiras com renda própria podiam votar, além das casadas mediante autorização do marido – pasmem! Mas, nesse tempo, ainda era mais ou menos assim: “Ó, mulé, só vota se quiser tá? Mas nem precisa, relaxa, nem é muito importante“, porque só o voto masculino era obrigatório. O feminino se tornou obrigatório em 1946.

Então, daí a termos, hoje, uma mulher eleita, é muito avanço.
Claro que isso não significa que todas as mulheres que já foram eleitas para algum cargo político são dignas de admiração – tenho vergonha alheia de seres femininos como a Marta Suplicy, a do “relaxa e goza” (sem noção…), por exemplo. Mas estou realmente satisfeita por termos hoje uma mulher presidente. Fui até tentar sanar uma dúvida minha, sobre se era presidentA ou presidentE e descobri que ambas as formas estão corretas. Mas prefiro usar presidentE, pra reforçar o fato de que não existem diferenças MESMO, além das diferenças anatômicas, hormonais e de yin e yang.

Quando as mães da minha geração eram pequenas, não era muito comum elas quererem ter profissões fora do lar (sempre me lembro do filme “O Sorriso de Monalisa” quando penso nisso). As que queriam (pelo menos um grande número delas), queriam ser professoras. Naquele tempo, ser professora ou professor era um grande feito – infelizmente isso mudou, muito infelizmente mesmo. Quando as meninas da minha geração eram pequenas, a gente já ousava mais. Lembro-me de ouvir que minhas amigas queriam ser médicas, professoras, arquitetas, dentistas e tal. Eu mesma, não sei nem porquê (juro, não faço a mínima ideia!) quis fazer engenharia aeronáutica (oi?). Pois é. Queria mesmo, embora hoje nem saiba porque… Mas naquela época (que nem é tanto assim…) o ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica) não aceitava mulheres, olha só… Aí eu desisti. Hoje já aceita. Aí, depois, quis fazer Educação Física, porque treinei como atleta federada a minha vida inteira. Mas desisti. E resolvi fazer Biologia movida por minha imensa paixão pela ciência e pelo organismo humano. Mas nunca me ocorreu, por exemplo, ser presidente – do Brasil, eu quero dizer, porque da rua eu fui várias vezes (adoro!). Eu ouvia os garotos falando “eu quero ser presidente do Brasil” e me lembro de pensar “puxa, eu não posso porque sou menina…”. Nunca tinha ouvido ninguém dizer isso, que menina não podia ser, mas é que eu só via homens lá, então achava que não podia. Eu gostava – e adoro ainda hoje – a Mafalda, do Quino, justamente porque ela é uma menina cheia de consciência política e que vive dizendo “se eu fosse presidente…”.

Bom, acho que todo brasileiro, nesse momento, deveria estar colocando toda a sua boa energia no desejo de que a Dilma faça um bom governo, não importa em que direção vai o seu pensamento, se pra direita, pro centro ou pra esquerda. Porque, afinal, será no nosso feofó que a coisa vai estourar caso ela não o faça. Então, torcer por um bom governo em mais essa do PT é, também, advogar em causa própria.  Tenho visto muita gente praguejando contra o fato dela ter sido eleita. E, infelizmente (e para meu grande choque), geralmente são pessoas mais direitistas. E (daí meu choque) é gente que também diz, por exemplo, que o bolsa família é uma bosta porque, agora, nem tem mais porteiro querendo ser porteiro e que “esse pessoal” tá tudo querendo voltar pro nordeste, e o sul e sudeste estão ficando sem mão de obra (é sério, eu ouvi isso num tom muito lamurioso de uma pessoa teoricamente muito bem esclarecida).  Tenho ouvido bizarrices semelhantes de gente muito próxima, inclusive. Que é uma porcaria a Dilma ter sido eleita porque essa tal “redistribuição de renda tá misturando gentalha com quem é fino”. Sério. Ouvi isso. Fiquei até sem resposta na hora. Se tem uma coisa que eu detesto mais que corrupção política é preconceito – quem me conhece sabe disso. Acho que todo mundo tem direito de melhorar de vida, sim. Todo mundo é igual, sim. Todo mundo tem direito de ter acesso a tudo, sim. E o que eu tenho visto, infelizmente, é uma certa sobreposição entre praguejar contra a nova presidente e manifestar opiniões de cunho claramente preconceituoso. Estou feliz por termos, agora, uma mulher lá em cima, em tempos de redistribuição de alguma coisa, mesmo que ínfima.

Não acompanhei tudo sobre quem está em qual ministério agora. Vi que o Fernando Haddad está no da Educação e achei interessante. Mas vi também que o Mercadante ficou com o da Ciência e Tecnologia e não gostei nem um pouco…

Estou feliz porque estamos entrando numa nova era. E a Clara, lá no futuro do pretérito, vai poder escolher com toda liberdade a profissão que ela quiser. Se quiser ser professora, ótimo. Se quiser ser secretária, ótimo. Se quiser ser médica, dentista, engenheira, educadora física, bióloga, tudo ótimo também. Mas o legal é que ela vai crescer sabendo que, se quiser, também pode ser presidente. Vai que…

Vamos ver agora as cenas dos próximos 4 anos de capítulos.

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