Toda mulher que se descobre grávida descobre, também, que irá conviver com toda sorte de comentários e perguntas focadas em sua gestação, seu parto e seu bebê. Pergunta-se sobre o sexo do bebê, sobre o nome do bebê, sobre como será seu parto, onde, quando e com quem, sobre se irá amamentar, sobre sua volta ao trabalho, sobre a cor do quarto, a escolinha que frequentará, os brincos, as vacinas, o pediatra, sobre tudo.

E então o bebê nasce.

E as perguntas mudam. Dorme bem? Quantas vezes acorda para mamar? Como foi o parto? Está mamando? No peito ou na mamadeira? Já introduziu outros alimentos? Já engatinhou? E os dentinhos? E o cocô? E seu peso, já voltou ao que era? Já foi pra creche? Quando irá? E, nossa, dorme sozinho? E, nossa, dorme com você? E insira aqui qualquer outra pergunta ou comentário que seja constantemente feito a uma mãe, durante a gestação ou após o nascimento. De todos os tipos. Todos. Menos um.

“Como você está? Você está bem? Como está sua adaptação? Como estão seus sentimentos? Posso te ajudar? Como posso te ajudar? Do que você está precisando? Está precisando de algo? Como está seu coração? Quer falar sobre isso? Olha… Estou aqui. Aguente firme. Isso aí, essa coisinha aí dentro, essa tristeza, eu também a conheço. Tenha calma. É isso mesmo, é assim mesmo. Segure minha mão. Eu também sei o que é isso… Olha, estamos juntas”.

E enquanto continuamos a falar coisas incríveis sobre parto, sobre ser mãe, sobre o nascimento do bebê, sobre a imensidão deste amor, sobre como seu primeiro sorrisinho é inebriante (e é, é mesmo), sobre como cheirinho de bebê em casa é incrível (e é, é mesmo), enquanto cercamos a maternidade e a chegada de um bebê com uma aura de encantamento e deslumbre, deixamos de falar sobre algo que, SIM, PRECISAMOS FALAR: sobre como tudo isso pode ser difícil. E doloroso. E sofrido. E solitário. E desafiador. E sim, pode ser mesmo. Muito.

Nós precisamos muito falar sobre isso. Precisamos falar sobre o puerpério, sobre o pós-parto. Sobre aquele período que começa assim que o bebê sai de dentro da gente e que pode se alongar por muitos meses…  Nós precisamos falar sobre isso. Porque quando não falamos, ou quando falamos apenas das nuances cor de rosa da maternidade, nós condenamos mulheres a ainda mais dor, ainda mais sofrimento, ainda mais isolamento e sentimento de estranhamento com si própria, com seu bebê, com sua nova condição, com seu novo mundo. Quando dizemos que o puerpério não é de difícil travessia, nós tornamos invisível uma dor muito comumente sentida. Nós tornamos mães invisíveis. Nós podemos agravar um problema social e de saúde muito sério. Nós podemos contribuir para tornar patológico algo que não o é obrigatoriamente.

Depois que nosso bebê nasce, descobrimos algo que ninguém nos avisou, informou ou alertou: que nós, agora mães, vamos precisar de tanto apoio, cuidado e atenção quanto nosso bebezinho que acabou de nascer. Quase todas nós sentimos isso. Quase todas nós choramos nos dias ou até meses seguintes ao nascimento. E nos sentimos sozinhas. E achamos que não vamos dar conta. Que não vamos conseguir. Que nunca mais seremos as mesmas. Sentimos que algo nasceu e algo morreu. Que algo foi encontrado e que algo se perdeu. E nos sentimos incompreendidas, desamparadas, secundárias ou terciárias na ordem do dia, estranhas, incapazes de lidar com as dificuldades. E não podemos fingir que isso não acontece. Porque acontece sim. Todos os dias. Todos os dias mulheres choram sozinhas após o nascimento de seus filhos. E todos os dias mulheres superam. Todos os dias mulheres também descobrem que sim, dão conta. E que ter ouvido uma palavra de apoio, incentivo, faria muita diferença. Que ter tido mais informação sobre puerpério poderia tê-la ajudado a atravessar. Que falar sobre o assunto poderia, sim, tê-la fortalecido. E, assim, fortalecer outras mulheres.

É por isso que, hoje, estamos convidando você, que passou por momentos difíceis no seu puerpério e o superou, ou o está superando, a falar sobre isso para outras mulheres, para a sociedade, para todos. Porque precisamos falar sobre isso. Todos os dias nascem milhares de bebês. O que significa que nascem milhares de mães. E se os bebês são lindos e importantes, as mães são mais, inclusive porque delas dependem os primeiros. São lindas, são importantes e precisam ser ouvidas. Todos os dias, milhares de mulheres estão vivendo um pós-parto. Todo dia tem uma mulher que gostaria de saber que não está sozinha nessa, que é uma das experiências mais marcantes e mais profundas da nossa vida. Precisamos fazer com que nossas vozes, ao serem ouvidas, mostrem problemas importantes que não estão sendo contemplados pelas políticas de saúde e pelas políticas sociais. Que nossas vozes, ao serem ouvidas, mostrem que sim, é lindo parir, é lindo amamentar, mas é preciso olhar a mulher que está fazendo isso, sem vê-la como um meio para um fim. Não é possível mais negligenciar mulheres, deixado que se tornem mães sem saberem ou sem estarem preparadas para os desafios que virão após o nascimento do seu bebê. Precisamos dar espaço para que mulheres que passaram por essa fase com algum tipo de sofrimento possam compartilhar suas experiências com outras mulheres. E também possam falar sobre como conseguiram, o que fez falta, o que poderia ter ajudado.

Acreditamos sinceramente, de todo nosso coração, no poder de cura de falar e compartilhar experiências com outras mulheres. E é para isso que queremos convidá-las hoje. Já fizemos uma vez, quando produzimos o documentário “Violência Obstétrica – A Voz das Brasileiras”. E deu mais do que certo, pois é também com a ajuda dele que estamos transformando o cenário violento de nascimento no Brasil. Muitas mulheres mudaram suas vidas para melhor depois que compartilharam suas experiências com o coletivo. Queremos fazer isso de novo. Vamos tirar as dores do puerpério da invisibilidade. Fale! Conte para outras mulheres! Ajude outras mulheres! Nós vamos amplificar a sua voz. O convite está aberto de 10 a 17 de julho de 2015. Vamos trabalhar duro, voluntariamente e com muito amor para produzir esse novo documentário. Ele não é parte do trabalho de pesquisa de nenhuma de nós. Estamos fazendo porque acreditamos no poder da amplificação da voz das mães. Das mães brasileiras. As instruções se encontram na imagem abaixo.

Um grande e sincero abraço,

Heloísa de Oliveira Salgado
Ana Carolina Franzon
Ligia Moreiras Sena – do blog Cientista Que Virou Mãe
Thais Cimino – do projeto Temos Que Falar Sobre Isso

AS MULHERES E O PUERPÉRIO – A VOZ DAS BRASILEIRAS



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