Então a gente tem um ginecologista que nos acompanha desde a juventude. Então a gente engravida e ele se mostra um obstetra despreparado. Então a gente espera nosso bebê nascer no tempo convencional de gestação, entre 38 e 42 semanas. Mas então nosso bebê nasce antes, muito antes. Então a gente passa por muitos procedimentos sem estar, ainda, realmente preparada. E passa por uma cesariana que até hoje não sabemos se realmente necessária. E então nosso bebezinho, tão frágil, pequeno e prematuro, precisa ir para a U.T.I., que será sua casa por cerca de dois meses. Dois meses… E nós não podemos ir com ele, porque não conseguimos, estamos convalescendo de uma cirurgia. E então, não podemos sentir o seu cheirinho e ainda precisamos nos certificar de que é ele mesmo, é o seu nome mesmo ali, na etiqueta da encubadora. E a gente vai embora para casa, enquanto nosso filho se fortalece e se prepara para a vida, em uma estrutura que pretende ser como um útero, mas não o é.
A amamentação em um ambiente assim é um desafio, tanto pelo ambiente estéril, técnico e mecânico quanto pela falta de acolhimento e apoio por parte da equipe. E, claro, porque nosso bebê não está constantemente em nossos braços, nem sentimos constantemente seu cheirinho, o que é importante para a produção adequada do leite. Tudo passa a ser um desafio, inclusive a construção do vínculo. Mas nós superamos, nós conseguimos, nós fazemos dar certo.
Mas não, eu não posso dizer “nós”. Essa é uma experiência que eu não vivi. Mas, a despeito disso, consigo perfeitamente colocar-me no lugar dessas mulheres fortes, determinadas, que começam a vida de mãe em um lugar diferente do que imaginaram durante a gravidez: a U.T.I. Consigo solidarizar-me, acolher e amparar essas mulheres porque, afinal, nós, mães, somos sempre um pouco parecidas, pelo simples fato de conhecermos um amor insuperável: o amor por nossos filhos.
Foi por isso, então, que após ler o relato que inesperadamente me chegou por e-mail, convidei sua autora a postá-lo aqui. Porque a mensagem que ela transmite é de força, superação, autoconhecimento, sabedoria e protagonismo.
Ela é a Paula Prezia. E ele é o Caio. Caio nasceu antes do tempo convencional (embora no seu
próprio) e precisou de uma U.T.I. neonatal. E foi não somente dessa experiência mas, principalmente, de sua ressignificação que Paula encontrou amadurecimento e ponto de equilíbrio.
Convido você, então, a ler esse depoimento tão comovente e inspirador. De uma mãe que transformou uma experiência delicada e difícil em ponto de mutação.
Paula, obrigada pela confiança em compartilhar comigo sua história. E por permitir que a publicação dela aqui ajude a fortalecer e inspirar tantas mulheres que, como você mesma disse, podem estar se sentindo mais sozinha do que as outras.
Peço sinceras desculpas às “mães de U.T.I.” (expressão utilizada pela Paula em seu relato) pelo fato de nunca ter abordado esse tema aqui. Um tema tão especial, voltado a quem precisa de amparo, conforto, acolhimento e fortalecimento. Espero que vocês se sintam mais fortalecidas e confiantes e que, à semelhança da Paula, transformem essa experiência em “descoberta de seu próprio protagonismo“.
Esse não é apenas mais um relato de nascimento e amamentação.
É uma história de vida.
Por Paula Prezia
Mãe do Caio
concluir que eu não tinha dilatação e o bebê correria risco se esperássemos mais. Do choque ao trocar a sala à meia luz à qual já me habituava pelo circo iluminado do centro cirúrgico, anestesia, piadinhas sobre uma possível plástica, movimentos truculentos que me abriam e arrancavam meu filho de dentro de mim. Tudo lavado pelo inesquecível choro que me revelava em um momento minha vocação maior, pela qual seria capaz de qualquer coisa, inclusive de aceitar o processo antinatural que o salvara.
A confiança em mim mesma tem sido desafiada continuamente em minha experiência com a maternidade. Eu, que antes era classificada como “alternativa”, inicialmente me rendi totalmente à medicina convencional, aos resultados rápidos, ao mensurável, aos manuais antiquados e aos indicadores de desenvolvimento. Só voltei a questionar depois de ele completar um ano e meio. Comecei a ler avidamente, me nutrir de informação, muitas vezes tardia, que espero que me sirva para ajudar outras mães. Os blogs foram fundamentais e o seu leitura obrigatória. Ajudaram a dissipar um pouco a imensa solidão que sentia, que acho que todas as mães sentem. Foram companhia em minha jornada materna e suporte em direção à ação consciente. Mudanças gradativas e cada vez mais profundas foram se instalando.