Vou te dar uma humilde sugestão.
Arrume um tempo entre seus afazeres diários, faça um café, chá ou outra bebida que lhe agrade, sente-se e leia essa longa história, que merece ser lida em cada detalhe.
Hoje, inaugurando a seção CIENTISTAS QUE VIRARAM MÃES – uma forma de homenagear tantas mulheres que se dividem entre a ciência e a maternidade – temos uma história de inspirar, de emocionar, de brilhar os olhos. Uma carreira impecável, uma história emocionante, uma mulher determinada e que luta não só pelo bem estar dos próprios filhos, mas pelo respeito a todas as mulheres.
Senta, que a história é longa.
E vale cada linha lida.
É de emocionar.

Dra. Melania Amorim em letras vermelhas, que é a cor da energia dessa mulher.

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É com imensa alegria e satisfação que inauguro esta seção “Cientistas que viraram Mães” (sabem como é, gente, eu só consigo escrever “Mãe” com esse M maiúsculo que vocês veem), neste blog fantástico da minha amiga Ligia Moreiras Sena, que acompanho com interesse há algum tempo. É claro que eu conheço muitas cientistas que são mães, entre colegas e orientadas já convivi com diversas mulheres que enfrentam os múltiplos desafios de conciliar carreira acadêmica e criação dos filhos. Todavia, o que achei fantástico foi descobrir pela Internet uma série de outras cientistas que partilham de minhas ideias sobre parto, nascimento, amamentação, maternagem e criação com apego. Cientistas que ajudaram a construir essas ideias, e que contribuíram para solidificar as minhas convicções ou que me abriram os horizontes para pensar diferente e, por que não, para mudar. Afinal, nem sempre eu fui esse conjunto de convicções e esse tanque de guerra de evidências científicas que sou hoje. Orgulho-me de ter mudado, e certamente a minha formação científica me ajudou nesse processo de mudança, porque depois de ler Thomas Kuhn e encontrar a Medicina Baseada em Evidências, estou sempre alerta para o que chamamos de choque de paradigmas e com a mente aberta às mudanças, desde que me provem que o modelo anterior é errado, insatisfatório ou tem lacunas que precisam ser preenchidas. 
Será que preciso mesmo me apresentar? Eu sou Melania, tenho 45 anos, sou Mãe de dois filhos, André com 19 anos e Joaquim com 22 meses, duas experiências de maternidade bem diferentes, afastadas por 18 anos, mas ambas deliciosas e desafiantes, que me vieram modificar a vida profissional tão detalhadamente planejada… E, estou convicta, para melhor. 
André e Joaquim, no aniversário de 19 e 1 aninho, respectivamente.
Um pouco da minha história profissional
Sou médica, formei-me aos 22 anos pela Universidade Federal da Paraíba, no então Campus II de Campina Grande, em 1989. Fiz residência médica em Ginecologia e Obstetrícia no Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira (IMIP), com término em 1992. Fiz o meu mestrado na mesma instituição, em Saúde Materno-Infantil (Saúde Pública com ênfase nos problemas da Mulher e da Infância), defendi a minha dissertação em 1995. Na época não existia programa de doutorado no IMIP, então fiz o meu doutorado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), com término em 1998. De volta ao IMIP, ingressei como docente do programa de pós-graduação, no qual estou até hoje, alternando com a minha vida em Campina Grande, porque em 2002 eu fiz concurso para a Universidade Federal daqui e passei, desde então também leciono Ginecologia e Obstetrícia para a graduação. Fui preceptora da residência médica em Ginecologia e Obstetrícia do IMIP entre 1992-2005, mas de 2006 para cá eu me concentrei na docência do programa de pós-graduação, que desde então inclui mestrado e doutorado (Conceito Capes 5). Entre 2008-2010 fiz pós-doutorado em Ginecologia e Obstetrícia na Unicamp e em Saúde Reprodutiva na Organização Mundial da Saúde (OMS), em Genebra.
Até viajar para Genebra, em 2009, eu fazia consultório e trabalhava com partos humanizados e gestação de alto-risco, além de exercer a Ginecologia Geral, mas quando voltei engravidei de Joaquim, uma gravidez planejadíssima e muito desejada, e decidi passar mais alguns anos sem exercer clínica privada, para ter mais tempo e disponibilidade para o meu Filhote. Mas depois eu voltarei a esse ponto, porque essa foi uma das grandes modificações que a segunda maternidade trouxe em minha vida.
Atualmente, ando para lá e para cá, porque trabalho em duas cidades (Recife e Campina Grande), tanto como professora de graduação como de pós-graduação, tenho muitos orientados de iniciação científica, mestrado profissionalizante, mestrado acadêmico e doutorado, de forma que sempre estou com alguém qualificando, fazendo pré-banca ou defendendo projetos, dissertações e teses. Uma loucura, mas uma loucura gostosa, porque eu sinceramente AMO fazer pesquisa, amo ensinar e orientar. Trabalho essencialmente com Pesquisa Clínica, conduzindo ensaios clínicos randomizados e grandes estudos de coorte, mas recentemente tenho me voltado também para a Pesquisa Translacional, um grande desafio! Coordeno dois grupos de pesquisa, Saúde da Mulher na UFCG e Saúde Reprodutiva e Perinatal no IMIP, e tenho uma produção científica bem vasta, que vocês podem conferir no meu CV Lattes.
Faço ambulatório de Ginecologia no Hospital Universitário da UFCG, ambulatório de Gestação de Alto-Risco, coordeno a Enfermaria de Alto Risco do Instituto de Saúde Elpídio de Almeida (ISEA) em Campina Grande, fui durante vários anos plantonista da UTI Obstétrica do IMIP, mas também parei por conta dos projetos maternais. Coordeno alguns projetos de extensão, dentre eles a menina dos meus olhos, que é o Projeto de Humanização da Assistência ao Parto no ISEA, que já anda pelo mundo divulgado em vídeos (confira alguns dos links abaixo), mas também o Grupo de Gestantes, cursos de formação de doulas e o Projeto Saúde no Presídio, voltado para a assistência transdisciplinar à população feminina carcerária.
Ativismo
Se há mulheres de fases, eu sou uma mulher de Causas. Daquelas com C maiúsculo, eis que sou superlativa. Sempre me considerei feminista e percorri toda aquela história típica de quem faz movimento estudantil: representante discente, Diretório Acadêmico, participação em movimentos sociais… A história é longa. Atualmente continuo às voltas com a militância mais focada em questões de gênero, que se confundem também com as minhas pesquisas: direitos reprodutivos, legalização do abortamento, redução de danos, humanização da assistência ao parto e nascimento, amamentação, violência contra a mulher, morte materna e saúde perinatal. Há momentos em que nem consigo, aliás, nem tento distinguir, a vocação ativista da pesquisa, felizmente elas andam de braços dados e eu tenho o enorme prazer de pesquisar, trabalhar e militar com aquilo que gosto. Não é fantástico?
Algumas pessoas do movimento da humanização da assistência ao parto se chocam com as minhas ideias e a atuação em prol da legalização do abortamento, mas eu não vejo qualquer incompatibilidade entre humanizar a assistência ao parto e legalizar o abortamento, vejo ambas as Causas como direitos reprodutivos, e costumo dizer que DEFENDO A MATERNidADE LIVRE, VOLUNTÁRIA, RESPONSÁVEL E PRAZEROSA. Além da questão de gênero, há uma questão básica de direitos humanos: as mulheres não merecem ser presas por praticar abortamentos clandestinos, as mulheres não merecem MORRER por adotar práticas inseguras com essa finalidade. Mais ainda, está comprovado que, além de reduzir a mortalidade materna, tanto os programas de legalização como de redução de danos reduzem o número total de abortamentos provocados, por aliarem uma política de contracepção com atenção pós-aborto (APA). 
Humanização da Assistência ao Parto
Apesar de militante feminista, eu tive uma formação médica bem convencional, nos moldes tecnocráticos, e foi o contato com a Medicina Baseada em Evidências que se iniciou no meu mestrado, a par da leitura dos livros da Robbie Davis-Floyd (“Birth as An American Rite of Passage” e “From Doctor to Healer”, principalmente), em um momento no qual eu também me aprofundava nos estudos da Filosofia da Ciência, que me levou a questionar a forma com que vinha prestando assistência a esse momento maravilhoso e transcendental que é o parto. Na medida em que eu deixava de ver o parto como evento médico e começava a entender as múltiplas dimensões, biopsicossociais e espiritual, a Medicina Baseada em Evidências (MBE) vinha ao meu encontro para demonstrar a falta de efetividade e segurança de uma série de procedimentos que eu tinha me acostumado a encarar como necessários na assistência ao parto: jejum, tricotomia, enema, repouso no leito, parto em decúbito dorsal, episiotomia e cuidados neonatais extremamente agressivos, como afastamento da mãe, aspiração de rotina de vias aéreas, dentre tantos. Sempre fui vaginalista, que é o termo que utilizamos para descrever os obstetras que preferem assistir a partos vaginais, mas definitivamente foi o estudo da MBE e da Antropologia do Nascimento que se somados à minha perspectiva feminista me despertaram para o conceito da humanização como a retomada da autonomia ou do protagonismo feminino no parto, como defende Ricardo Herbert Jones. Fui progressivamente abandonando práticas ultrapassadas, desnecessárias e prejudiciais, e hoje tenho uma taxa de cesarianas em torno de 8% nos partos assistidos no Projeto e há mais de 10 anos não faço uma única episiotomia!
Por outro lado, a Internet foi essencial para me colocar em contato com outras ativistas da Humanização, desde 2004, através do Orkut e da lista Parto Nosso, e a partir de 2009 no Facebook. Nossos encontros transcenderam a esfera virtual e hoje tenho grandes amigas e companheiras de luta nesse movimento que só tende a crescer, e que culminou neste ano de 2012 nas Marchas pelo Parto em Casa e pela Humanização do Parto. Essa participação em fóruns virtuais me colocou também em contato estreito com as mulheres, com suas perspectivas, seus desejos, seus planos, e hoje estou convicta de que a transformação do modelo tecnocrático, etiocêntrico, medicalocêntrico e hospitalocêntrico que vivemos só poderá vir por elas e através delas.  
Tantas mulheres (e alguns homens também): usuárias, ativistas, doulas, enfermeiras, companheiro e filhos: o Parto é Nosso!

A Maternidade em minha vida
Minha primeira gravidez “aconteceu” aos 24 anos e Andrezinho nasceu quando eu tinha 25, poucos meses depois de ter concluído a residência médica. A primeira grande mudança que a gestação gerou foi de planos para a pós-graduação, porque eu imaginava deixar o Recife e ir fazer mestrado e doutorado fora do País. Nunca pensei que seria mãe tão jovem (no meu ponto de vista), eu me imaginava adiando a maternidade somente para depois de concluída a minha formação acadêmica. Na verdade, houve um momento em minha vida em que eu cheguei a afirmar, categoricamente, que nunca iria casar e ter filhos. E eu tinha absolutamente claro que só haveria um caminho depois de me formar em Medicina: fazer residência e depois mestrado e doutorado. Se me perguntassem aos 14 anos, já era esse o meu plano!
Mas como essas gestações não planejadas não são fruto somente do acaso, eu me descobri desejando muito aquele bebê, e daí suspendi temporariamente os meus planos de pós-graduação strictu sensu e me dediquei a trabalhar como preceptora da residência e a gestar André. De qualquer forma, eu tinha muito tempo pela frente e, de uma forma ainda incipiente, eu já estava participando de pesquisas. O meu primeiro artigo foi publicado enquanto eu ainda estava grávida, em 1992.  Esse foi também o ano em que fiz, grávida de oito meses, o concurso para obtenção do Título de Ginecologia e Obstetrícia (TEGO) e diversos outros concursos para empregos públicos. Passei em todos em primeiro lugar, o Filhote na barriga não me impedia de estudar.

O Filhote Númer
o 1: nasce uma Mãe e se forma uma Cientista
André nasceu em uma sexta-feira, dia 02 de outubro de 1992, à 1h15min da manhã, depois de uma  indução mal sucedida por pré-eclâmpsia, por cesariana. Não obstante a felicidade com o seu nascimento, eu fiquei muito mal por ter sido operada, e por meu filho ter sido afastado de mim, depois de submetido aos procedimentos de rotina, porque como ele teve taquipneia transitória do recém-nascido, uma complicação respiratória, precisou passar 12 horas no berçário em oxigenioterapia. E eu também não conseguia entender por que tinha que passar por aquilo, uma cesariana, logo eu, tão defensora do parto normal! Enfim, a pulga estava atrás da orelha, mas eu me aferrei com unhas e dentes à ideia de amamentar. Sempre tive plena consciência das vantagens e dos benefícios da amamentação, eu era uma enciclopédia ambulante enfrentando o que eu chamo de “A Legião dos Inimigos da Amamentação”. Era bom ter na ponta da língua dados, estatísticas, recomendações, diretrizes.

E quando ele completou 10 meses eu entrei no mestrado, mas aí ele já comia outros alimentos, poucos meses depois desmamou espontaneamente, isto é, eu não fiz conscientemente nada para que ele deixasse de mamar. Mas tenho cá comigo que eu estava em outra vibe, em outro momento, muito focada em ler quilômetros de referências bibliográficas e pesquisar, além de continuar trabalhando e dando plantão! Fiquei chateada por ele ter parado tão cedo, porém não parei para pensar nos motivos do desmame, estava em um ritmo alucinante! Claro que não atribuo o desmame à minha formação científica, e sim à maneira com que EU lidei com a minha relação com o meu bebê enquanto me formava. Bem diferente…

Terminado o mestrado, quando André tinha três anos (ele foi para a minha defesa!), rumei para o doutorado, que fiz à distância, indo e voltando de Campinas. Foi um tempo bastante sacrificado, até porque nunca pude me dar ao luxo de fazer somente pós-graduação, tinha os meus vínculos empregatícios que não me liberaram. Ao defender minha tese [acesse-a pelo link] em 1998, eu coloquei essa Dedicatória:
Ao meu filho, André Filipe, 
Que tem apenas seis anos
Mas já passou cinco desses
Entre mestrado e doutorado
Crescendo entre as teses de sua Mãe.
Chega de saudade, meu Amor,
Estou voltando para casa.

Os anos se passaram, e quando Andrezinho tinha nove anos teve o diagnóstico – que geralmente é tardio – de Síndrome de Asperger (SA), um transtorno invasivo do desenvolvimento que faz parte do espectro autista. Essas crianças têm inteligência normal e se relacionam com o mundo, embora à sua própria maneira, então muitas vezes o diagnóstico passa despercebido ou é confundido com outros tantos diagnósticos, como o rótulo, hoje tão comum, de TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade).  
Foi bom ser cientista nessa hora. Não somente para pesquisar, ler e entender as pesquisas sobre o assunto com olhar crítico, mas para definir a melhor conduta a seguir com ele. Ser cientista não me fez amá-lo mais ou menos, mas tornou a aceitação mais fácil. Os tempos em que lidei com uma série de psicólogos e psicopedagogos mal preparados que tudo atribuíam à minha separação é que foram mais difíceis. 
Depois que li muito sobre autismo e SA, resolvi “tratá-lo” à minha maneira, isto é, sem remédios (na época do suposto diagnóstico de TDAH ele chegou a tomar Ritalina), de início com suporte psicoterapêutico, depois nos mudamos para Campina Grande para que eu pudesse ter um ritmo de vida mais normal e ter a ajuda – imprescindível – de minha mãe, que tinha se aposentado – para supervisionar suas atividades escolares e extracurriculares. 
O Filhote mais velho, com sua sinceridade desconcertante, sua forma tão peculiar de encarar o mundo e as pessoas, me dá lições de vida diárias, além de ser fonte constante de divertimento, com suas “tiradas” típicas. Ele agora faz Faculdade de Jogos Digitais. Na foto ao lado nós estamos dançando uma valsa no casamento de meu irmão: Mãe e Filho, amigos e cúmplices! 

O Filhote Número 2: a Cientista experimenta pela segunda vez a experiência da M
aternidade
Joaquim foi uma gravidez planejada, planejadíssima, e MUITO desejada. Eu já tinha 42 anos e vinha de duas perdas gestacionais precoces, mas não desisti de tentar e, sem nenhum tratamento ou investigação estrambótica, engravidei. Tudo era diferente, eu não somente já tinha conquistado uma posição acadêmica sólida, chegando ao pós-doutorado, como era professora, médica, parteira, ativista, militante da Humanização… E através da Humanização tinha chegado às comunidades de gestação, parto e maternidade no antigo Orkut e sido introduzida a diversos outros temas palpitantes: além de amamentação, maternagem! Foi através das amigas e grupos na Internet que cheguei ao conceito de attachment parenting, depois traduzido para o português como  “criação com apego” e fui apresentada a diversos autores e leituras deliciosas, dentre as quais destaco os livros de Carlos Gonzalez e Laura Guttman.
A ideia de recomeçar estava rondando a minha cabeça havia alguns anos, mas certamente estar nesse meio tão “ocitocinado” às voltas com gestantes, paridas e lactantes e diante de uma nova filosofia de criação dos filhos reforçou esse desejo e em 2009 eu resolvi tentar. Um outro bebê para uma outra Mãe.
 E Joaquim nasceu no dia 03 de outubro de 2012, 00h03minutos da manhã, de uma cesariana intraparto bem indicada depois de 26 horas de trabalho de parto, que foram momentos de indescritível felicidade em minha vida. À parte a dor no corpo e na alma – não é fácil ser cortada quando você planeja um parto normal – foi absolutamente fantástico, depois de 18 anos, ter novamente um recém-nascido em meus braços:
Amamentando Joaquim no primeiro dia de vida
Em nenhum momento, todavia, tinha passado pela minha cabeça que eu iria ter dificuldades para amamentar, já que tinha uma história prévia de amamentação bem sucedida. Só que eu tinha me submetido há alguns anos a uma mamoplastia que acabou resultando em redução da minha produção láctea, o que levou Joaquim a perder bastante peso no primeiro mês. Assim, amparada por minhas consultoras de lactação  virtuais, eu iniciei a translactação, como mostro na foto, e praticamente passava o dia, no intervalo entre as mamadas, desmamando pendurada em uma bomba elétrica: de fato, não há forma mais efetiva de aumentar a produção de leite que não essa, amamentar e desmamar. Deu certíssimo! Deixei de translactar quando ele estava com quatro meses, introduzimos progressivamente alimentos a partir dos seis meses e ele mama até hoje, aos 22 meses, não dando nenhum sinal de que está disposto a parar.
Aproveito para indicar os fantásticos livros de Diana West e o site http://bfar.org/index.shtml que podem ajudar as mães que, como eu, têm história de cirurgia mamária prévia e não querem abrir mão de amamentar os seus filhos: sim, nós podemos!

 Achei interessante porque a maioria dos obstetras e pediatras, além dos cirurgiões plásticos, ainda têm muitos pensamentos equivocados sobre o tema (mamoplastia vs. lactação), e há relativamente poucas publicações no Medline, o que foi um estímulo para que eu pensasse em estudar mais a fundo o assunto. Com uma imensa fila de artigos científicos e projetos de pesquisa engatilhados, pode ser que demore um pouco, mas a cientista quer estudar mais esse problema que a Mãe enfrentou, para poder incentivar e aconselhar outras mulheres.

Por outro lado, tenho que destacar que foi fundamental nesse período ter tido direito a uma licença-maternidade de seis meses, que eu fiz questão de emendar com as férias. Consegui passar sete meses em casa! Essa foi uma diferença crucial em relação à primeira vez, realmente ser mãe aos 25 anos com tantos projetos profissionais engatilhados e não ter essa licença-maternidade estendida me roubou um tempo que eu poderia ter dedicado ao meu filho. Sempre fui e serei defensora da licença-maternidade prolongada e eu pude vivenciar como, na prática, é importante contar com esse tempo. Eu nunca pensei em deixar de trabalhar, parteria e pesquisa são partes fundamentais de minha vida, mas acho que nos primeiros meses de vida do bebê realmente, além de qualidade, QUANTidADE de tempo é importante; embora outras soluções alternativas sejam possíveis, estou convencida que as mães que não podem ou não querem parar de trabalhar devem ter direito a esse tempo com os seus bebês.
De qualquer forma, não foi um tempo estéril em termos científicos: primeiro, porque eu estava tendo ganhos importantíssimos na relação Mãe-Bebê que me tornaram uma pessoa melhor, e esse ganho no meu potencial humano É um ganho para a pesquisadora. Segundo, porque apesar de não estar frequentando fisicamente meus locais de trabalho, eu continuei trabalhando usando essa ferramenta t
ão útil, essencial para qualquer pesquisador, um computador com acesso à Internet.  Fiz buscas na literatura, revisei projetos, corrigi artigos, prossegui a orientação dos meus estudantes, e até recebi algumas vezes em casa orientadas grávidas ou amamentando. Uma de minhas estudantes de doutorado ia com sua bebê que mamava para minha casa, nós amamentávamos juntas enquanto fazíamos as modificações da tese e quando ela finalmente defendeu eu brinquei dizendo que cada página estava manchada de leite.
Às vezes Joaquim participa dos meus estudos.
Organizei e promovi eventos científicos durante a amamentação e uma de minhas fotos favoritas é essa, que eu chamo de “Palestrante e Lactante”.
De qualquer forma, essa nova experiência de maternidade aos 43 anos foi um soco no estômago: nunca pensei que seria tão visceral, transformadora, e acho que o fato de que Joaquim surgiu no horizonte quando eu já estava firmada profissionalmente, no auge da minha carreira profissional, contribuiu para que eu conseguisse desacelerar sem traumas. Nós fomos uma díade, desde o começo, e muitos foram os momentos em que eu vivi o que Winnicott chama de “loucura materna”: eu sentia o que ele sentia. Coup de foudre, epifania. 

Voltar é que foi complicado, depois de sete meses em casa eu me senti defasada, achava que a Medicina e a Obstetrícia tinham mudado completamente e eu não tinha acompanhado… Mas isso durou pouco, porque voltando eu pude perceber que não havia tanta defasagem e, bem, pesquisar e me atualizar nunca foram problemas para mim.  Durante o primeiro ano de vida, consegui espaçar as viagens para cursos e congressos, o que me manteve mais próxima do Filhote, e agora nesse segundo ano é que o mundo tem me solicitado intensamente, mas ele é superparceiro: tenho sempre feito viagens curtas, de no máximo três dias, mas quando ele tinha 15 meses precisei me ausentar 10 dias porque o Número 1 foi fazer uma cirurgia em São Paulo, e a cada viagem o reencontro é o mesmo, ele pula para o peito como se nunca tivéssemos nos afastado. Amamentar um bebezão de 22 meses é uma delícia, e eu vou prorrogar o aleitamento enquanto essa for uma experiência satisfatória para ambos, ou pelo menos até quando eu possa conversar com ele a respeito. Não gosto quando perguntam: “Ele ainda mama?” porque não é “ainda”, estamos dentro do mínimo preconizado pela Organização Mundial da Saúde.
Junto com os dois Filhotes, e próximo já do aniversário de 20 e dois anos de cada um, esta Mãe Cientista e esta Cientista Mãe está convencida de que não existem soluções mágicas, que cada maternidade é um desafio diferente, mas que Ciência e Maternagem caminham muito bem juntas, obrigada. Para MIM, conhecer e interpretar as evidências que dão suporte ao meu sistema de crenças, fazer as minhas escolhas e tomar as minhas decisões com base nessas evidências foi muito importante. Ao mesmo tempo, a experiência de ser Mãe fez com eu voltasse o meu foco, como cientista, para questões importantes como Parto, Amamentação, Criação dos filhos, e é com um olhar amoroso que eu me debruço sobre esses temas, não somente pesquisando, mas divulgando as pesquisas de forma a poder ajudar outras mães e outros bebês nesse exercício diário de uma maternidade consciente e prazerosa.
Para acompanhar de perto o meu trabalho de divulgação científica, acessem o meu blog: www.estudamelania.blogspot.com. Através de artigos, entrevistas, revisões da literatura, compartilhamento de aulas e projetos, eu adentrei a blogosfera materna com o objetivo de familiarizar o público com a “linguagem” das evidências científicas, traduzindo-as e interpretando-as para que sejam compreendidas mais facilmente pelas usuárias. Tod@s temos direito à informação para tomar decisões pertinentes ao cuidado do ciclo gestação-parto-maternidade. 

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Veja aqui alguns vídeos do Instituto de Saúde Elpídio de Almeida (ISEA), cuja Enfermaria de Alto Risco é coordenada por Melania Amorim.

A caminho da humanização, parte1.

A caminho da humanização, parte 2.

A caminho da humanização, parte 3.

A caminho da humanização, parte 4.

Deixo aqui registrado meu agradecimento sincero à Melania, não só por ter aceito o convite de inaugurar essa seção, mas por tudo o que ela representa e tem feito ao cenário do respeito ao parto e nascimento do Brasil e à luta pelo respeito às escolhas femininas.
Na próxima semana, mais uma cientista contará sua história aqui.
E se você também é uma cientista que virou mãe e quer participar desse encontro de mulheres, mande sua história para ligiamsena@yahoo.com.br.
Muitas lindas histórias já chegaram.
É muita emoção, minha gente.

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