Essa talvez seja uma das postagens mais tristes que já fiz neste blog. Não sei se você sentirá ao longo da leitura o mesmo que senti ao longo da escrita. Mas a mim foi bastante penoso falar sobre isso.
Não apenas porque tornei-me uma ferrenha combatente contra a medicalização da infância, a favor do respeito à criança, ou porque sou mãe, ou porque, hoje, estudo diferentes formas de violência.
Mas principalmente porque detenho um título de doutora na área de neurofarmacologia.
Você vai entender…
O texto é longo. O tema não é simples. Mas é da mais fundamental importância para quem cria filhos, para quem gosta de pessoas, para quem acredita que algo muito sério está acontecendo.
Então eu recomendo fortemente que você reserve um tempinho para ler o que está aqui.
Nessa minha vida como mãe integrada a diferentes redes maternas, tive a feliz oportunidade de conhecer uma mulher bacana, mãe três meninos, sendo o caçulinha um pouquinho mais velho que minha filha. Há alguns dias, ela postou no grupo sobre maternidade do qual sou moderadora uma angústia que estava vivendo e que era a seguinte. Ela foi a uma reunião da escola e a professora falou que seu filho estava “cheirando objetos”. Como ela nunca havia percebido algo desse tipo em casa, achou bastante estranho. Eu bati o olho naquela postagem e saquei o que estava acontecendo: a professora estava, muito delicadamente, sugerindo que o filho dela possuía um transtorno do desenvolvimento. No momento que li, minha vontade foi postar por ali mesmo ou chamá-la em privativo e dizer: “Escuta, esquece isso. Fulaninho não tem o que você está pensando que ele tem“, assim, à queima roupa. Acontece que eu não sabia até onde havia ido a conversa entre ela e a professora, ou se era isso mesmo que a estava angustiando e ela não queria falar. Então não postei nada. Mas fui acompanhando. E pensando…
Pois bem.
Dias depois, li outra postagem em que mães se sentiam angustiadas porque os filhos de 2 aninhos ainda não falavam. Eu lia aquilo e era como se pudesse ouvir a eco dos seus pensamentos: “Será que ele tem algum problema? Será que ele é normal?”. E então, enquanto eu escrevia esse texto, uma amiga me chamou e confidenciou exatamente a mesma coisa: seus familiares a estavam pressionando justamente em função do filho de 2 anos ainda não falar, também sugerindo a possibilidade de transtornos do desenvolvimento cognitivo.
Dúvidas sobre se um filho é saudável ou não toda mãe tem, em algum momento de sua vida. Mas daí a ter sugestões de possíveis psicopatologias ou de transtornos do desenvolvimento? Como foi que isso aconteceu? O que é que está acontecendo que está levando tantas pessoas a tentarem enquadrar o diferente como anormal?
Estão acontecendo algumas coisas muito sérias.
- Estamos medicalizando o normal.
- Estamos inserindo a patologização nas nossas vidas cotidianas – nada mais é considerado vida comum, tudo agora é transtorno.
- Estamos dando aval a profissionais para que deem pseudodiagnósticos.
- Estamos valorizando muito mais os rótulos do que respeitando as personalidades.
- Estamos desconectados das crianças.
- Estamos comparando diferentes personalidades e esperando um padrão.
- Estamos absolutamente despreparados para acolher as diferenças
- Estamos acomodados e com preguiça de criar ambientes inclusivos, acolhedores, estimulantes e respeitosos para a criança.
- Estamos transferindo nossos papéis como pais, educadores, condutores, para caixinhas de remédios, porque, afinal, é muito mais fácil comprar…
Tanta criança sendo medicada para SER COMO OS OUTROS.
É exatamente isso o que acontece quando se medica comportamentos. Dizemos: você, assim como você é, não serve. Você veio com um defeitinho e nós vamos consertá-lo. Assim você poderá ser como Mariazinha, que é tão boazinha, não incomoda nem me cansa.
Seis pessoas me enviaram ontem o link para uma matéria recente, publicada dia 09 último na Folha de São Paulo.
O título da matéria:
Isso me chocou tanto que ao invés de apenas publicar a matéria na íntegra, decidi publicá-la juntamente com alguns comentários. A matéria foi escrita por um jornalista para o New York Times e também publicada na Folha de São Paulo. Em vermelho, minhas considerações.
“Quando o médico Michael Anderson fica sabendo que seus pacientes de baixa renda estão enfrentando dificuldades na escola primária, geralmente lhes receita um medicamento forte: Adderall. (Adderal é o nome fantasia para uma droga psicoestimulante pertencente à classe das anfetaminas, utilizado para o tratamento do TDAH – transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, comercializada somente nos Estados Unidos. Age aumentando a dopamina e a noradrenalina cerebrais. A droga produz efeitos colaterais extremamente sérios, como atrofia do desenvolvimento e pode levar a episódios de crises psicóticas. Um dado importante: ela age sobre estruturas do cérebro que recebem o nome de “sistema de recompensa”, o mesmo sistema que é ativado por drogas como a cocaína. Ou seja: ela possui um grande potencial de dependência e deve ser encarada como droga de abuso. Em 2005, o governo do Canadá suspendeu a venda de Adderal por estar associada a 12 mortes súbitas em jovens, mas a suspensão foi revogada tempos depois. O uso crônico pode levar a quadros recorrentes de psicoses. Mas voltemos à matéria, lembrando que o médico Michel Anderson prescreve essa droga para pacientes pobres que mostram dificuldades escolares).
Os comprimidos aumentam a atenção e o controle de impulsos de crianças que apresentam transtorno de déficit de atenção com hiperatividade. Embora
o TDAH seja o que Anderson diagnostica, ele descreve o transtorno como “inventado”, dizendo que não passa de uma desculpa para receitar pílulas para tratar o que ele vê como sendo o verdadeiro mal das crianças: desempenho acadêmico fraco em escolas inadequadas. (Michel Anderson, médico, acredita – como tantas outras pessoas – que o TDAH não existe como transtorno psicopatológico, que ele foi inventado para dopar crianças que estão indo mal nas escolas. Nas escolas “inadequadas”, ressalta o médico).
“Não tenho muita escolha”, disse Anderson, que é pediatra e atende muitas famílias pobres no condado de Cherokee, ao norte de Atlanta (EUA).“Nós, como sociedade, decidimos que custa caro demais modificar o ambiente da criança. Logo, temos que modificar a criança.” (por gentileza, leia novamente essa frase dita pelo médico Michael Anderson).
Anderson é um dos proponentes mais francos de uma ideia que vem suscitando interesse entre alguns médicos. Eles estão prescrevendo estimulantes a alunos que enfrentam dificuldades em escolas às quais faltam recursos. Prescrevem os medicamentos não necessariamente para tratar um TDAH, mas para favorecer o desempenho acadêmico dos alunos. (Eu não acredito que esteja lendo/transcrevendo para cá esse trecho… Estamos falando de algo abominável, de algo como o que foi feito há décadas atrás com a sífilis, com as comunidades africanas onde a indústria farmacêutica se instalou – você assistiu “O Jardineiro Fiel?” -, estamos falando de drogar, com o aval da medicina, pessoas menos favorecidas financeiramente…).
Ainda não está claro se Anderson é representante de uma tendência crescente. Mas alguns especialistas observam que, enquanto estudantes ricos abusam de estimulantes para elevar suas notas já boas em faculdades e colégios, esses medicamentos vêm sendo usados com crianças do ensino básico, de famílias de baixa renda, que têm notas fracas e cujos pais estão ansiosos por vê-los ter aproveitamento escolar melhor. (Os pais estão ansiosos para verem seus filhos se transformarem, às custas de sua saúde, de sua integridade física e mental, às custas da dependência química, em outras pessoas.).
“Nós, como sociedade, não nos dispomos a investir em intervenções não farmacêuticas muito boas para essas crianças e suas famílias”, disse Ramesh Raghavan, pesquisador de serviços de saúde mental para crianças na Universidade de Washington e especialista no uso de medicamentos vendidos com receita médica entre crianças de baixa renda. “Concretamente, estamos forçando psiquiatras que atuam nas comunidades locais a usar a única ferramenta da qual dispõem: os medicamentos psicotrópicos.” (Forçando?! Forçando psiquiatras?! Forçando psiquiatras a drogar as crianças?! A sociedade – essa malvada – está forçando os psiquiatras – esses coitados – a consumir produtos da indústria farmacêutica – essa pobre?! Que inversão brutal de contexto é essa?!).
A psiquiatra infantil Nancy Rappaport, de Cambridge, Massachusetts, que trabalha com crianças de renda mais baixa e suas escolas, acrescentou: “Estamos vendo isso cada vez mais. Estamos usando uma camisa de força química em vez de fazer coisas que são igualmente ou até mais importantes.”
Anderson diz que seu instinto é de um “pensador de justiça social”, alguém que quer “nivelar o campo um pouco”. Ele diz que as crianças com problemas acadêmicos que ele atende estão, basicamente, em desarmonia com seu ambiente — são peças quadradas que não se encaixam nos furos redondos do ensino público. Como suas famílias raramente têm meios para pagar por terapias de base comportamental, como aulas particulares e atendimento psicológico à família, a medicação, segundo ele, torna-se o modo mais confiável e prático de redirecionar o aluno no sentido do sucesso.
Que espécie de xenófobo é esse, que se autoproclama um justiceiro social, às custas da integridade e autonomia de crianças e jovens pobres?! Em desarmonia com seu ambiente? Então são os ricos os ambientalmente harmônicos, com os quais os pobres devem ser equiparados?
“Não dou a medicação a alunos que estão tirando notas boas”, ele explicou. Para alguns pais, o medicamento traz grande alívio. Jacqueline Williams disse que não consegue agradecer Anderson o suficiente por diagnosticar TDAH em seus filhos –Eric, 15 anos, Chekiara, 14, e Samhya, 11– e prescrever Concerta, um estimulante de ação prolongada, a todos. Williams disse que cada um deles estava tendo dificuldade em ouvir as instruções dos professores e concentrar-se na lição de casa. (Quantas Jacqueline Williams existem por aí, que conhecemos, que ouvimos agradecer ao santo psiquiatra que diagnosticou seus filhos, em consultas de meia hora, com portadores de transtornos como o TDAH? Que espécie de mãe gosta de ver seus filhos usando drogas psicotrópicas lícitas para que sejam domados, moldados, dopados e parem de dar trabalho? que espécie de ensaio sobre a cegueira é esse?).
“Meus filhos não queriam tomar o remédio, mas falei a eles: ‘Essas são suas notas quando vocês estão tomando, e essas são de quando não estão’, e eles entenderam”, ela contou, observando que o Medicaid cobre quase todos seus custos com o médico e os medicamentos. (Eles entenderam. Eles entenderam que são defeituosos, doentes, com problemas, que precisam ser consertados, que não são normais, que não podem tirar boas notas sem medicação, são marginais no sentido de à margem da normalidade. Sim, eles entenderam. Entenderam como sua mãe s
ó quer seu bem, ainda que não se dedique ativamente para ajudá-los no entendimento e aceitação de suas diferenças, ainda que estejam em escolas despreparadas para receber o diferente, mas que acolhe – com prazer e sem drogas – os filhos do sistema).
Alguns especialistas não veem grande problema no fato de um médico responsável usar medicamentos contra TDAH para ajudar um estudante em dificuldades. Outros –mesmo alguns dos muitos, como Rappaport, que são a favor do uso de estimulantes no tratamento do TDAH clássico– temem que os médicos estejam expondo as crianças a riscos físicos e psicológicos não justificados. Alguns efeitos colaterais relatados dos medicamentos já incluíram a supressão do crescimento, aumento da pressão sanguínea e, em casos raros, episódios psicóticos. (Temem que os médicos estejam expondo crianças a riscos? Temem? Quantos neurônios funcionantes são necessários para ver a verdade gritante de que essas crianças estão sendo drogadas, de que se está criando um grupo dependente, controlado por medicação? De que isso é um crime contra a criança e o adolescente? Que é um crime contra os direitos humanos?).
O transtorno, que se caracteriza por desatenção e impulsividade graves, é um diagnóstico psiquiátrico cada vez mais comum entre crianças e adolescentes americanos: em 2007, considerou-se que cerca de 9,5% dos americanos de 4 a 17 anos tinham o transtorno, segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças, ou 5,4 milhões de crianças e adolescentes. (Então me digam, meus amigos. Há realmente um transtorno ou foi inventado para controle social? O que de fato é comum, o diagnóstico ou a tentativa de dominação e opressão? O que realmente é grave nisso tudo? Onde entra nesta classificação nosológica a opinião do médico em questão – e de tantos outros – sobre ser uma doença inventada?).
A prevalência relatada do transtorno vem subindo constantemente há mais de uma década, com alguns médicos satisfeitos com seu reconhecimento amplo, enquanto outros receiam que o diagnóstico e os medicamentos para tratar o transtorno estejam sendo dados pouco criteriosamente, de modo que exclui terapias não medicamentosas. (O que exatamente vem subindo constantemente, a prevalência do transtorno ou a intolerância às diferenças? A prevalência do transtorno ou o despreparo das famílias e das escolas? A prevalência do transtorno ou o mercado farmacêutico? Quando alguns médicos sentem-se satisfeitos com seu reconhecimento amplo, do que se está falando mesmo? De saúde pública ou de saúde financeira?).
O DEA (órgão dos EUA que fiscaliza medicamentos) classifica esses medicamentos como substâncias controladas de nível dois, porque são criadores de dependência. Segundo muitos especialistas, ainda não se conhecem bem os efeitos de longo prazo do uso dos medicamentos por períodos extensos. Alguns deles temem que as crianças possam se tornar dependentes dos remédios até a idade adulta, muito depois de quaisquer sintomas do TDAH terem se dissipado. (E se não se conhecem bem os efeitos de longo prazo do uso dos medicamentos por períodos extensos, o que são essas crianças além do grupo teste? Por que falamos tanto em defesa dos animais de experimentação enquanto crianças e jovens pobres estão servindo de ratos de laboratório?).
De acordo com diretrizes publicadas no ano passado pela Academia Americana de Pediatria, os médicos devem empregar uma de várias escalas de classificação comportamental, algumas das quais incluem dezenas de categorias, para se certificar de que a criança se enquadra apenas nos critérios do TDAH e não apresenta outra condição relacionada, como a dislexia ou o transtorno desafiador opositivo, em que raiva intensa é dirigida contra figuras de autoridade.Mas um estudo publicado em 2010 no “Journal of Attention Disorders” sugeriu que pelo menos 20% dos médicos disseram não seguir esse protocolo quando fazem seus diagnósticos de TDAH, sendo que muitos seguem seus instintos pessoais. (Instintos pessoais? Que método de diagnóstico é esse? De que in$tinto$ pe$$oai$ estamos falando?).
Na estante da cozinha da família Rocafort, de Ball Ground, Geórgia, ao lado da manteiga de amendoim e dos cubos de caldo de galinha, há uma cesta metálica repleta de remédios das crianças prescritos por Anderson: Adderall para Alexis, de 12 anos, e Ethan, 9; Risperdal (um antipsicótico para a estabilização de estados de ânimo) para Quintn e Perry, ambos de 11 anos; e Clonidine (um sonífero para contrapor-se aos outros medicamentos) para as quatro crianças, que o tomam todas as noites. (Escrevo sozinha na madrugada. Nesse momento, choro de tristeza. Não somente por saber que crianças estão vivendo essa abominação. Mas porque estou profundamente envergonhada. Sou doutora em neuropsicofarmacologia, estudei os efeitos cerebrais das drogas psicoativas, muitas vezes em busca de novos compostos existentes na flora brasileira. Sinto-me muito mal nesse momento… O que estão fazendo com o trabalho dedicado de tanta gente? O que estão fazendo com os anos de estudo de tantas pessoas? E, pior: o que estão fazendo com essas crianças? A partir daqui, não mais comentarei a matéria. Deixarei que você ouça sua própria voz interior ao ler o que vem abaixo. Quero que você veja com seus próprios olhos. Quero que você enxergue a nossa sociedade e o que estamos fazendo com nossas crianças.).
Quintn começou a tomar Adderall para o TDAH cinco anos atrás, quando seu comportamento rebelde na escola suscitou telefonemas para sua casa e suspensões. Ele imediatamente se acalmou e tornou-se um aluno mais atento e sério –um pouco mais como Perry, que também tomava Adderall para o TDAH.Mas no início do turbilhão químico da puberdade, quando Quintn tinha cerca de 10 anos de idade, ele começou a envolver-se em brigas na escola, dizendo que outras crianças estavam insultando sua mãe. O problema era que isso não estava acontecendo; Quintn estava vendo pessoas e ouvindo vozes inexistentes, um efeito colateral raro, mas conhecido, do Adderall. Depois de Quintn admitir ter pensamentos suicidas, Anderson prescreveu uma semana num hospital psiquiátrico local e a mudança de Adderall para Risperdal.Quando contaram a história, os pais de Quintn o chamaram e pediram para ele descrever por que o Adderall tinha sido receitado.“Para me ajudar a prestar atenção na escola, fazer minha lição de casa, ouvir mamãe e papai e n
ão fazer o que eu fazia antes com meus professores, que os deixava bravos“, falou o garoto. Ele descreveu a semana que passou no hospital e os efeitos do Risperdal: “Se eu não tomo meu remédio, fico tendo atitudes. Fico desrespeitando meus pais. Sem o remédio eu não estaria como estou agora.“Apesar da experiência de Quintn com o Adderall, os Rocafort decidiram usar o remédio com sua filha de 12 anos, Alexis, e seu filho de 9, Ethan. Eles não apresentam TDAH, disseram seus pais. O Adderall é apenas para ajudá-los a ter notas melhores e porque Alexis estava, nas palavras de seu pai, um pouco “nem aí com nada”.“Já vimos os dois lados do espectro: vimos o lado positivo e o lado negativo“, comentou o pai, Rocky Rocafort. Reconhecendo que Alexis usa o Adderall por motivos “cosméticos”, ele disse: “Se eles estão se sentindo positivos, felizes, estão socializando mais e isso os está ajudando, por que não usar?”
O pediatra e neurologista pediátrico William Graf, que atende muitas famílias pobres em New Haven, disse que uma família deve ter o direito de decidir se o Adderall pode beneficiar seu filho que não tenha TDAH e que um médico pode eticamente (????) prescrever o medicamento de modo experimental, desde que os efeitos colaterais sejam monitorados atentamente. Mas ele disse temer que o uso crescente de estimulantes desse modo possa colocar em risco a “autenticidade do desenvolvimento”.“Essas crianças ainda estão na fase de desenvolvimento. Ainda não sabemos como essas drogas afetam biologicamente o cérebro em desenvolvimento“, ele explicou. “Os pais, médicos e professores têm a obrigação de respeitar a questão da autenticidade, e não sei se isso está acontecendo sempre.”
Anderson disse que todas as crianças para as quais já receitou medicamentos para TDAH se enquadraram nos critérios. Mas ele critica esses critérios, dizendo que foram codificados apenas “para fazer algo completamente subjetivo parecer objetivo”. Ele acrescentou que os relatórios dos professores quase invariavelmente voltam citando comportamentos que justificariam um diagnóstico, decisão que descreveu como sendo mais econômica que médica.“A escola disse que, se tivessem outras ideias, investiriam nelas, mas que as outras ideias custam dinheiro e recurso, comparadas com medicamentos“, disse Anderson.
Vários educadores contatados para este artigo consideraram o tema do TDAH tão controverso que se negaram a comentar; disseram que às vezes é feito uso equivocado do diagnóstico, mas que, para muitas crianças, o transtorno gera uma deficiência grave de aprendizado. O superintendente de um grande distrito escolar na Califórnia, exigindo anonimato para falar, observou que os diagnósticos de TDAH vêm aumentando à medida que as verbas para o ensino vêm diminuindo.
“É assustador pensar que chegamos a isso, que a falta de verbas para o ensino público que possibilitem atender as necessidades de todas as crianças levou a isso”, disse o superintendente, aludindo ao uso de estimulantes por crianças que não apresentam o TDAH clássico. “Isso pode estar acontecendo aqui mesmo. Talvez não tão conscientemente, mas pode ser consequência de um médico que vê uma criança sendo reprovada em salas de aula superlotadas com 42 outras crianças, e os pais frustrados perguntando o que podem fazer. O médico diz ‘talvez seja TDAH, vamos experimentar com a medicação’.”Quando foi informado que o casal Rocafort afirma que seus dois filhos que estão tomando Adderall não têm TDAH e nunca tiveram, Anderson disse estar surpreso. Ele consultou as fichas das crianças e encontrou o questionário dos pais. Cada categoria que avalia a gravidade dos comportamentos associados ao TDAH tinha recebido escore cinco (o máximo), com a exceção de uma, com escore quatro.“Esse é o motivo de minha angústia”, disse Anderson. “A gente afixa um rótulo a uma coisa que não é binária –você a tem ou não. Não dizemos simplesmente que há um aluno que está tendo problemas na escola, problemas em casa e que provavelmente vai tentar um tratamento médico, prescrito pelo médico com a concordância dos pais.““Podemos não conhecer os efeitos de longo prazo do remédio, mas conhecemos os custos no curto prazo do fracasso escolar, que são reais. Eu olho para a pessoa individual e como ela está agora. Sou médico do paciente, não da sociedade.”Tradução de CLARA ALLAIN
O teor desse texto é de uma gravidade sem tamanho…
ar, uma vez que o TDAH é um tema controverso.
Nos dias de hoje, nos tempos que vivemos, é inaceitável que uma pessoa se mantenha em cima do muro em questões como essa. Isso não é somente falta de comprometimento social, mas é também falta de ética, de solidariedade, de atitude humana, de honestidade.
Quanto mais gente declaradamente posicionada tivermos, mais forte estaremos na defesa dos valores humanos e da cidadania.
Se é mais cômodo fechar os olhos?
É. Não dá dor de cabeça, não atrapalha a novela, nem tumultua seu sonho feliz de realidade.
Mas te faz cúmplice dessa lama toda.
Ou você está a favor do respeito aos seres humanos, à criança, à infância e a todos os que são considerados “vulneráveis”, ou está contra.
Um profissional que patologiza uma criança normal, fazendo dela um doente – como aconteceu com a mãe que mencionei no início – ou quem prescreve Adderal, Concerta, Ritalina e afins a crianças para que se moldem a um sistema deficiente, deficitário e que não as acolhe em suas diferenças, não oferecendo possibilidades reais para seu crescimento como ser humano, achando que as está ajudando, não é um justiceiro social, ainda que se autoproclame assim.
É um FDP – com o perdão do palavrão.
E se diz que tem a consciência tranquila ainda que faça isso, cuidado.
Muitos miseráveis também tiveram.