Na madrugada em que completamos 8 meses como mãe e filha-extra-útero, Clara e eu tivemos um grande presente: dormimos quase uma noite inteira sem acordar… Ela acordou somente uma vez e eu, pela primeira vez em cerca de 240 dias, dormi profundamente.
O caminho desse sétimo para oitavo mês foi muito especial, muito intenso e cheio de coisas inesquecíveis. Foi, inclusive, um mês de retrospectiva de algumas coisas, uma retrospectiva involuntária que foi acontecendo aos poucos… E foi quando eu ouvi “mamã” pela primeira vez, ou qualquer coisa parecida com isso que teve claramente esse sentido.
Ela aparenta estar com mais idade do que tem, mais pela forma como se comunica e expressa o que quer do que pela constituição física – embora tenha crescido muito mesmo. Está com os mesmos dois dentinhos (dentões) que tinha aos 7 meses e não apareceu nenhum outro. Está bem gordinha e comprida, com seus 9 quilos e qualquer coisa, especialmente concentrados na barriguinha (ona) e nas pernocas, que a gente brinca que foram amarradas com barbante e ficaram em gomos. Ela dá tchau, brinca com os braços, e tem uma coisa especial com as próprias mãos. Ela gira as mãos num movimento de dançarina de flamenco e às vezes parece que sabe tocar castanholas. No começo do mês, quando ouvia qualquer música, começava a girar as mãos, especialmente a direita. Agora, bate palminhas bem sincronizadas – uma delícia de se ver! Essa semana começou a piscar bem forte os olhos quando quer fazer charminho, a demonstrar timidez com quem ainda não conhece e que vem falar com ela (que dura 2 minutos), abaixando a cabecinha mas deixando os olhinhos pra cima, com esses ciliões que ela tem. E, também nesses últimos dias, aprendeu a se esconder. Quando a gente vai chegando, ela fica tão eufórica que grita e esconde a cabeça no que tiver na frente: almofada, peito da mãe, ombro do pai, graças a Deus ainda não tentou esconder a cabeça na parede. Continua sem comer papinha, não curte esse lance de trecos culinários amassados. Mas tá mandando ver no pãozinho e naquilo que pode ser colocado inteiro na boca e que vira uma coisa babenta não identificada depois. Está, cada dia mais, demonstrando mais e mais interesse por comida, e tenho dado coisas diferentes pra ela experimentar quando estamos almoçando: ela resiste, mas logo abre a boquinha e manda pra dentro uma quantidade ínfima. E anteontem começou a dar sinais de que pode ser que comece a engatinhar muito em breve, com os bracinhos bem firminhos apoiados no chão. Um monte de pequenas surpresas encantadoras. Fala, fala, fala, fala um tempão, e grita bem forte. Pra dormir não faz exatamente uma guerra, mas às vezes fica sacudindo as perninhas como quem quer sair correndo, ou dorme e fica acordando a cada 20 minutos – nesses dias é uma canseira, mas no dia seguinte sempre aparece uma novidade.
Mas no momento de dormir, parece que somos uma só. Dormimos juntas e muito agarradas e, quando ela dá aquelas acordadinhas noturnas, é só juntá-la bem pertinho, virá-la pra mim que, automaticamente, coloca o dedinho na boca e recomeça a dormir. É um momento incrivelmente especial, em que ela demonstra todo o amor que sente por mim – e eu sempre faço questão de deixar claro pra ela que a amo acima de todas as outras coisas. E foi nesse caminho do sétimo para o oitavo mês que percebi que ela REALMENTE sabe disso.
Ainda sobre dormir, há cerca de uma semana tenho percebido que todas aquelas muitas vezes que ela acorda a noite (eu já relatei aqui várias vezes o transtorno que a falta de sono contínuo tem causado na minha vida) nem sempre são porque ela quer realmente mamar. Tenho feito um teste nesses últimos dias: quando ela dá aquela choramingada, que antes era exclusivamente pra mamar, eu a aninho, dou um beijinho na mãozinha do dedo que ela chupa e ela volta a dormir na hora. Não é mamá que ela quer. É mamãe. A mamãe que ela sabe que está sempre por perto, mesmo quando sai pra trabalhar às 7 da manhã e volta às 14 horas, sem almoçar e com o peito jorrando. Ela não sofreu nada daquelas coisas que dizem por aí que existe quando a mãe volta ao trabalho, que alguns chamam de ansiedade de separação. Acho que é porque ela fica com o pai dela, que é tão próximo e dedicado a ela quanto eu sou.
Bem, nesse último mês tenho pensado especialmente sobre o que é ser mãe. As demandas vão aparecendo e as escolhas que vou fazendo vão me levando a pensar sobre isso. Sobre o que é ser mãe, o que se espera de uma mãe, qual a real importância de uma mãe na vida de uma pessoa de qualquer idade, de como é importante essa figura e do que a falta dela pode gerar na vida de alguém. Tenho conversado muito com ela, dizendo como é grande o amor que eu sinto, como ela é importante pra mim e como, embora eu ainda esteja perdida no mundo e me sentindo meio sem nicho ecológico, a chegada dela trouxe um ar novo pros meus pulmões e uma razão verdadeiramente especial para estar viva. Digo que estarei sempre ao lado dela, quando ela estiver triste e quando estiver feliz, e que sempre será prioritária nas minhas escolhas, porque sei da responsabilidade que é ter recebido um filho. Eu sempre acreditei – sempre mesmo, mesmo antes de ser mãe – que um dia alguém vai perguntar pra quem teve filho: “E aí? Como estão aquelas pessoas que eu confiei aos seus cuidados e amor? Como foi essa viagem?”. Estou fazendo tudo, todos os dias, para que eu possa responder tranquila: quem você me confiou está bem. Está segura, física e emocionalmente. Se sente amada e protegida. Sabe que é querida e que é muito importante pra alguém. E isso a torna forte.
Pergunto-me sempre: fui uma boa mãe hoje? E é com muita alegria e orgulho que tenho sempre tido respostas positivas da minha consciência.
Sim, tenho sido uma boa mãe. A despeito dos dilemas, das angústias, das inseguranças características de uma mãe de primeira viagem. Tenho uma filha muito bacana, tranquila, alegre, simpática, que praticamente não chora e que é muito ligada à gente.
E vou amá-la e respeitá-la todos os dias da minha vida.
Na alegria e na tristeza, na saúde ou na doença.
Porque foi esse o “casamento” que eu escolhi pra mim – eu, que nunca quis me casar e que sempre tive como cerimônia dos sonh
os, a defesa do meu doutorado. Escolhi casar com a responsabilidade e com o infinito amor que é ser mãe.
Tenho me sentido exausta fisicamente, meio largada, com vontade de me dedicar mais às coisas que eu gosto mas sem poder, sentindo vontade de ter mais tempo pra mim. Mas nada disso me confunde ou me impede de dizer que esses 8 meses foram a melhor coisa que poderiam ter me acontecido e que eu tenho uma filha como nunca imaginei que fosse ter.
Minha filha querida: estarei sempre do seu lado. Física e metaforicamente. Quando precisar de mim, estarei. Você nunca estará só. Tenho te criado pra vida, não pra mim, e estou surpresa como a voluntariedade desse gesto tem te trazido cada vez mais pra mim. Esse último mês foi, dos 8 meses, aquele em que mais nos senti como UMA SÓ novamente, como éramos quando você estava na barriga ou era bem recém-nascida.
Aliás, a chegada do friozinho tem me trazido à memória as lembranças inesquecíveis do último inverno, quando você chegou. Toda minusculinha e frágil, enrolada nos cobertores, dormindo a maior parte do tempo. Hoje, quando coloquei em você a primeira roupinha da sua segunda temporada de friozinho, me toquei como você já está grande. E como é ainda pequena.
Foi nesse oitavo mês que entendi, realmente, o que quer dizer uma música que eu sempre me nego a ouvir, porque me lembro de chorar quando a ouvia ainda criança (eu achava que o pai da criança não a queria mais porque ela estava crescendo, ói que doida):
“Menininha não cresça mais não… Fique pequenininha no meu coração”
Não, filha, pode crescer. Cresça feliz e segura. Te tenho pra sempre pequena aqui dentro, porque vivo integralmente cada momento da sua pequenice. Sempre terei boas lembranças desses nossos primeiros meses de vida juntas, marcados por esse nosso amor tão explícito.
É uma alegria infinita ser sua mãe.
(é muito bom ser mãe de alguém…)