Sim, a vida amorosa não está simples para ninguém. Na verdade, nunca foi. Talvez o maior estranhamento dos tempos atuais é que estamos nos habituando a falar mais abertamente sobre isso. Passamos, enquanto coletivo, muito tempo dourando fatos que não eram tão dourados assim, escondendo relacionamentos abusivos, maquiando roxos emocionais – e, às vezes, físicos. Muito dessa honestidade que vem sendo compartilhada nas redes tem, como seu apoiador, os movimentos feministas, que vêm tirando véus cor de rosa de fatos bastante cinza. Isso nos traz uma possível percepção de que as relações não estão boas. Mas o fato é que, não sei você, mas eu continuo preferindo enxergar a realidade do que me iludir com pseudofatos. Porque isso me permite fazer escolhas melhores, mais honestas.
Se você tem a seu lado alguém que vibra pelas suas conquistas, se preocupa com a escolha das palavras que usa para falar sobre você, te incentiva a ir em frente, aplaude os desafios vencidos e se mostra disponível, tenho uma notícia: você não merece nada menos do que isso. Ninguém merece. E, no entanto, ainda existem pessoas que se mantêm presas a relacionamentos bastante tóxicos e minadores de energia.
Por que estar com alguém assim?
Por alguns motivos, todos muito humanos. Às vezes, falta-nos força para nos desvencilhar. Às vezes, não temos alternativa. Às vezes, sequer enxergamos o lugar sombrio em que estamos. Às vezes, é uma escolha estratégica, e tudo bem ser. Mas uma vez visto, “desver” não pode ser uma escolha.
Relacionar-se é desafiador. Mas não pode ser sinônimo de doloroso. “O amor dói”. Se dói, não é amor. Se dói, algo está com problemas – a fisiologia nos ensina isso. É preciso olhar para a dor como um sinal de que há algo a ser consertado, cuidado. Ou a dor piora e se alastra, e quando se vê, estamos todos tomados por ela, supurando. Silvia Badim, professora da UnB e mulher que admiro muito por sua trajetória e pela forma como expõe seus pensamentos, uma vez disse:
“Venho discordando de Vinícius de Moraes. Amor só é bom se doer? Perguntei pro meu orixá e ela, sorridente, me disse: deita a cabeça no colo do amor e descansa, filha. Amor é bom com leveza. Amor é bom com calmaria profunda. Amor é sorte boa. Não precisa mais sangrar”.
Anda-se dizendo por aí que os relacionamentos estão muito volúveis. Que pessoas se unem e se separam muito rapidamente. Que ninguém tem paciência para “construir um relacionamento”. Que antes os casamentos duravam mais. Sim, duravam. Também porque as pessoas – especialmente as mulheres – precisavam silenciar suas dores e mazelas. Muitas avós de hoje, casadas 40, 50 anos, silenciaram muito, doeram muito, simplesmente porque não se tinha muita opção. E não foi sem dor coletiva que hoje, em maior ou menor grau, nós as temos.
A verdade é que um relacionamento não pode ser considerado positivo pelo tempo que ele dura, mas pelo que ele constrói. Pelas palavras que são ditas. Pelo carinho e entrega que se teve. Por coisas que não foram jogadas na cara. Pelo companheirismo que se nutriu. Pelas remadas juntas que foram dadas. Se ele construiu dor, sentimento de abandono, mágoa, golpes à autoestima, carinho negado, ausência de companheirismo ou de remada conjunta, ele pode durar 30 anos e, ainda assim, não pode ser considerado bom.
Um relacionamento não pode ser uma âncora, que te mantém presa no mesmo lugar. Ele precisa ser um lastro. Quem é mergulhador sabe porquê: o lastro não te prende, ele ajuda a manter o equilíbrio, permitindo que você suba sem perder o objetivo do mergulho ao mesmo tempo que não te afunda.
Se você estiver tentando subir sem conseguir, analise o que te prende. Se for o seu relacionamento, dê uma segunda chance. Não para ele, mas para si. Todo mundo tem o direito de viver uma vida plena. Nada vale mais que seu amor próprio de volta, seu brilho no olhar, sua autoconfiança.
Se você não tem ao seu lado alguém que te diga, frente a uma atividade desafiadora “Vai lá e quebra tudo”, talvez você não precise ter ninguém. Talvez você possa ficar sozinha. Talvez encontre em si mesma o incentivo que busca fora de si. E esteja mostrando pros seus filhos que “Mamãe tem alguém que a respeita: ela mesma”.
Como disse a orixá de Silvia: deita a cabeça no colo do amor e descansa, filha. Se não for assim, não é amor.
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Parte do meu trabalho é apoiar mulheres nas mais diferentes questões das suas vidas: maternidade, educação sem violência, empoderamento, fortalecimento, carreira profissional, desenvolvimento científico. Sou Mestra em Psicobiologia pelo Departamento de Psicologia e Educação da USP, Doutora em Ciências/Farmacologia pela Universidade Federal de Santa Catarina e Doutora em Saúde Coletiva também pela Universidade Federal de Santa Catarina, com foco na saúde das mulheres e das crianças. Se você precisa de apoio e orientação, mande um e-mail para ligia@cientistaqueviroumae.com.br que eu te explico como funciona a MENTORIA E APOIO MATERNO.