Quem se interessa pela fisiologia do parto, pelo respeito ao nascimento, quem busca saber mais sobre esse evento pelo qual TODOS passamos – seja como mulher dando à luz seja como filho ou filha que nasceu – com certeza já leu Michel Odent. Considerado um dos precursores internacionais da humanização e do respeito ao parto e nascimento, obstetra francês que instituiu as piscinas ou banheiras no ambiente de parto, Odent é um profundo estudioso da saúde primal.
Em suas palestras e livros, temos a oportunidade de entender porque o parto é um evento que precisa acontecer em um local quieto, privativo, pacífico e acolhedor, condições importantes para que a chuva de hormônios inunde a mulher e a conduza em tranquilidade e segurança pela partolândia.
Privacidade, silêncio, intimidade, para que a mulher se conecte com seus instintos e possa parir com o mínimo de intervenções possível.
Todo mundo que se interessa pelo tema sabe disso.
Menos algumas maternidades.
Talvez porque não se interessem por isso, mas apenas por quanto cobrar por coisas absolutamente desnecessárias e, principalmente, bizarras.
“Um bebê é exibido diante da câmera segundos depois do nascimento. Em uma sala no mesmo andar, familiares se emocionam em frente à tela de 52 polegadas e, para comemorar, abrem uma garrafa de espumante. Cenas como essas se repetem diariamente numa maternidade em Niterói, na região metropolitana do Rio, que abriu o “cine parto” há cerca de um ano. Lá, parentes e amigos das gestantes assistem ao vivo à chegada da criança num auditório com capacidade para 20 pessoas sentadas. Por R$ 200, eles alugam o espaço e acompanham pela televisão o trabalho da equipe médica na sala de parto da maternidade São Francisco, localizada em uma área nobre do município (a 13 km do Rio). As imagens são captadas por uma câmera instalada no alto do centro cirúrgico. Já a gestante pode ver a festa da família por uma outra televisão colocada próxima aos médicos.
(…)
As imagens do parto não são inteiramente transmitidas para os familiares. Eles só acompanham em tempo real o que acontece na sala de cirurgia após o corte ter sido feito na barriga da gestante.
Depois disso, a médica, que atua como diretora, libera o sinal para o auditório. Mesmo assim, o espectador tem a visão bem limitada por causa da distância da câmera, que é posicionada atrás do médico.
“Não entramos no campo cirúrgico. Além de respeitar o profissional, que está trabalhando, preservamos também os familiares. Eles não veem o bisturi, o corte, sangue. A intenção é mostrar apenas o nascimento da criança”, conta Albuquerque.
O dono da maternidade disse que inicialmente enfrentou a resistência dos médicos, mas que atualmente os cerca de cem profissionais que trabalham na clínica aderiram ao serviço.
A obstetra Elizabeth Irene Alves era uma das que resistiu ao “cine parto”. “Estranhei no início, mas essa inovação deixa todos mais relaxados na família e não nos atrapalha”, disse a médica após realizar mais uma sessão em frente à câmera.”
RESPEITA-SE O PROFISSIONAL.
RESPEITA-SE OS FAMILIARES.
Não há qualquer tipo de preocupação em se respeitar a experiência de nascimento ou o bebê que está chegando.
DEIXA DE SER NASCIMENTO, PASSA A SER UMA UMA “SESSÃO” (como diz a própria obstetra).
Como se agenda um parto natural? Claro que não se agenda.
A única forma de nascimento que se agenda é a cesárea eletiva.
Olhe bem na imagem e você verá que é justamente uma cesárea que está acontecendo lá.Obviamente que essa maternidade – SÃO FRANCISCO, NO RJ – não incentiva o parto normal nem o parto respeitoso, do contrário saberia que uma mulher não tem condições de parir em condições ideais em uma arena de circo.
Mas o pessoal acha legal, acha bacana. Acha chique.
É desse tipo de falta de consciência crítica que estamos falando.
“Ainda que a segurança do procedimento seja o pré-requisito para o amplo uso da cesariana, essa não é a principal razão para o aumento nos índices da intervenção obstétrica. A razão fundamental para o aumento dos índices de intervenção é certamente uma falha universal e quase cultural no entendimento das necessidades básicas das mulheres em trabalho de parto. Depois de milhares de anos de partos culturalmente controlados, um século de industrialização da obstetrícia, uma proliferação de “métodos” de “parto natural” (como se a palavra “método” e “natural” fossem compatíveis) e do advento de uma técnica segura que oferece uma outra opção além do parto vaginal, pode-se facilmente explicar por que essas necessidades básicas foram esquecidas.Ninguém deve contar com um modelo cultural para redescobrir as necessidades das mulheres em trabalho de parto. Na maioria das sociedades que conhecemos, em geral o meio cultural interfere nos processos fisiológicos por meio das atendentes de parto, que não só são ativas como invasivas. Por exemplo, em muitas sociedades há a crença de que a atendente de parto deve estar ali para cortar o cordão imediatamente, que é uma forma de proteger o bebê recém-nascido do “perigoso” colostro ou de outros efeitos “negativos” do contato olho-no-olho e pele-com-pele entre mãe e bebê recém-nascido.Essa é a razão pela qual precisamos da linguagem e da perspectiva de fisiologistas modernos (cientistas que estudam as funções do corpo) para voltar às nossas raízes, para ver o que é cultural e universal, e portanto redescobrir as necessidades básicas das mulheres em trabalho de parto. Essa perspectiva também pode nos ajudar a compreender as razões comumente dadas para explicar os altos índices atuais de incisões cesarianas – monitoramento fetal eletrônico, medo de processos, falta de parteiras, mudança no papel das parteiras, alto índice de trabalhos de parto induzidos, uso frequente de peridurais e dos diferentes aspectos da industrialização do parto em geral – são basicamente a consequência de uma difundida falta de entendimento da fisiologia do parto. (página 29)”
“A cesariana segura como um bem de consumo também é recente na história da humanidade. Não há nenhum modelo cultural. Enquanto isso, podemos estudar as principais características das diferentes culturas em relação à forma como os bebês nascem, explorando as bases de dados especializadas. Quanto mais necessidade uma sociedade tem de desenvolver a agressividade e a capacidade de destruir a vida, mais invasivos são os rituais e as crenças culturais no período do nascimento. (página 64)”
O Circo de Moscou que se cuide…
A concorrência tá acirrada.