Quando a gente resolve criar um blog, tudo pode acontecer. Pode ser que ele fique lá paradão, ou pode ser que você se dedique ativamente a ele. Pode ser que ele sirva como agregador de amigos e família, ou pode ser que se escreva anonimamente por medo de expor a si e sua própria vida. Pode ser que ele sirva como um diário aberto, ou como um espaço para análise crítica de temas que te interessam. Ou não, pode ser que se queira apenas um espaço menos fechado que um editor de texto para dar vazão aos próprios pensamentos.

Quando eu comecei esse blog, nem esse nome ele tinha.
Nem mãe eu era.
Nem tinha os interesses que tenho hoje.
Decidi criar um blog para registrar devaneios de maneira aberta, depois da insistência de amigos e de surgir a vontade pessoal. Escrevia anonimamente, tanto pelo desconforto que sentia em escrever abertamente sobre mim e minha vida no ainda desconhecido mundo cibernético quanto pelo medo da crítica alheia.
Depois me tornei mãe e meus interesses foram se definindo até chegar ao que sou hoje: mãe da Clara, pesquisadora em Saúde Coletiva, estudando a violência obstétrica e a medicalização da vida, ativista do respeito ao parto e nascimento, interessada e estudando sobre práticas afetuosas de criação de filhos, gregária, desbocada, irritadinha, notívaga e cheia de ideias  que me tiram o sono.
Após o início da maternidade, com a definição consolidada dos interesses que tenho hoje, foi natural que o blog passasse a defender as mesmas ideias e princípios. E aí ele se tornou isso que é hoje: uma atividade à qual me dedico ativamente, que serve de contato entre amigos e família, que serve também para encontrar novos amigos com interesses e atitudes afins e como uma forma aberta de diário sobre minha vida como mãe, pesquisadora e cidadã, um espaço de crítica, um hobbie, um meio de compartilhamento de informações e de sensibilização e inspiração de outras pessoas. 
Hoje, não escrevo anonimamente: escrevo com nome e sobrenome, assumo o que escrevo, dou a cara a bater. Venci a tendência narcisista que te faz querer ser anônima para não revelar a verdade sobre quem se é, como se fosse possível ser diferente dos demais, ou de certa forma especial, a ponto de não dar aos outros o luxo de saber mais sobre si. Também não temo mais a crítica alheia, que somente me interessa quando vem para somar, de maneira sincera e inteligente, e não pelo criticismo improdutivo de quem pouco tem a contribuir mas não consegue controlar o impulso destrutivo. 
Este foi por muito tempo um blog sem moderação de comentários, mas hoje possui. Relutei muito em fazer isso, mas hoje, tendo feito, estou satisfeita, tenho filtrado muita ofensa pessoal e ataques de pessoas que não estão interessadas em discutir, mas em atacar – talvez por identificar semelhanças de pensamentos mas não aceitá-las… 
É um blog com posicionamento definido e não vive em cima do muro. Quem gosta, gosta, e quem não gosta, não gosta – mas ainda assim dá uma espiadinha. Acho bom. Acho digno. Prefiro assim. Não gosto muito de gente Neutrox.
Também escrevo como forma de organizar meus interesses, pensamentos e de encontrar com o Outro – esse que não conhecemos mas sabemos existir.
O livro “Blog: comunicação e escrita íntima na internet”, de Denise Schittine – que recomendo a quem se interessa pelo assunto – tem um trecho que fala especificamente sobre isso, sobre a oportunidade de encontro com o Outro que escrever um blog permite:

“A fixação na mente do leitor – esse Outro para quem escrevemos – se dá quando mostramos que somos também um pouco parecidos com ele. É dando a ele a sensação de que, quando está lendo sobre nós, lê sobre si mesmo. Como bem definiu Stella Cavalcanti numa entrevista: ‘Os blogs permitem que diferentes pessoas se conheçam melhor, nem que seja para a simples identificação. Todo mundo tem seus dias bons e ruins’. O leitor precisa sentir que está tendo acesso a uma memória que também é sua. Que quando o diarista constrói uma memória, ela é elaborada em conjunto com a dele. O escritor do blog tenta resgatar uma experiência, um momento, um sentimento compartilhado com o leitor na tentativa de fazer com que este não se esqueça dele – da mesma forma que não abandonaria a si mesmo”.

Ter um blog e mantê-lo ativo é incrível. Mas não minto: não é tarefa simples. É preciso dedicar tempo, atenção e cuidado.
Muitas pessoas me perguntam o que eu ganho escrevendo aqui.
Ganho muito. Muitísimo.
E não estou falando de valor monetário (embora fosse bom, obrigada). Estou falando de ganho pessoal em primeiríssimo lugar.
Não sou contra a monetização dos blogs, muito pelo contrário, sou bem a favor. Acredito que se alguns blogueiros passassem a ganhar financeiramente com seus blogs, de forma que pudessem se dedicar exclusivamente a eles, seria muito mais legal. Bem, digo por mim. Poder me dedicar a escrever tudo o que eu gostaria aqui, sabendo que estou sendo remunerada para fazer exclusivamente isso, seria sensacional. Muitos posts meus que estão em construção e continuam engavetados já teriam saído – como a influência da indústria farmacêutica sobre as informações sobre TDAH disponíveis na internet; a questão da culpa materna; os motivos que nos levaram a desescolarizar nossa filha após 2 semanas; as histórias de sete cientistas que viraram mães e que estão aguardando ser publicadas, e mais um tanto de coisa bacana, que não tive tempo hábil de postar porque precisava me dedicar ao que realmente paga as minhas contas.
Também me perguntam porque não ativo aqui alguns programas automáticos de monetização de blogs. Já ativei uma vez e não me senti confortável ao ver anúncios de suplementos alimentares, ou de procedimentos estéticos invasivos, de clínicas médicas, de práticas com as quais não compactuo. Não faz sentido. Já me basta o que aconteceu com aquela grande indústria que começa com N e termina com é…
Ou seja: meus ganhos como blogueira são muito mais pessoais que financeiros, com toda a certeza. Aqui vendo alguns livros que gosto e cujos autores conheço, as canecas e camisetas ilustradas por meu companheiro e, em breve, bodies e camisetas infantis com frases de ordem (!!), e tudo isso tem muito mais a finalidade de informar e entreter do que de ganhar dinheiro, mesmo porquê não consigo tempo necessário para divulgar essas atividades como se deveria.
Mas acontece que de um tempo pra cá os benefícios também se estenderam ao campo profissional. E de maneira muito forte. Há alguns meses tenho tido a grata oportunidade de ser convidada para escrever ca
pítulos de livros, ou matérias de revistas, ou de oferecer palestras e conduzir bate-papos sobre temas dos quais trato aqui. Na semana que passou, em uma aula de bioética, uma colega simplesmente me perguntou se eu tinha a noção do alcance que esse blog havia adquirido; que ela tinha ido à Brasília e, sabendo que ela fazia pós-graduação no mesmo departamento que eu, a perguntaram se me conhecia.
Pra mim isso ainda é um pouco surreal. Ainda não processei direito.
Claro que me alegro, como não me alegrar? Saber que o que você tem como prazer e comprometimento  está ajudando a criar oportunidade de discussão e debate é mais do que eu poderia imaginar…
Então quero compartilhar, com muita alegria e satisfação, mais duas conquistas que somente puderam acontecer por intermédio deste blog.
A primeira. Fui convidada pela Dra. Maria Aparecida Affonso Moysés, pediatra, doutora em Medicina, livre docente em Pediatria Social da UNICAMP e fundadora do Forum de Estudos sobre Medicalização de Crianças e Adolescentes para participar do FORUM PERMANENTE DE MEDICALIZAÇÃO DA VidA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES, compondo o grupo que vai debater sobre “Mitos e verdades sobre TDAH”, juntamente com ela, com Dra. Virgina Lopes Casariego, da Univerdad de La Matanza, de Buenos Aires e sob coordenação de Rosangela Villar, da Secretaria de Saúde de Campinas. O Forum vai acontecer no dia 21 de novembro próximo e as informações sobre ele podem ser obtidas aqui. Foi um convite inesperado e que me alegrou muito. É uma honra para mim ter sido convidada pela Dra. Cida Moysés, que é inegavelmente uma grande autoridade nesta área – e que foi orientadora do meu atual orientador, Dr. Charles Dalcanale Tesser. Dra. Cida me encontrou através dos textos sobre medicalização que publico aqui vez ou outra.
E a segunda. 
Entre junho e julho deste ano, enchi-me de coragem, reuni alguns textos já publicados aqui, sentei, escrevi um projeto e o submeti ao Edital de Criação Literária 2012 da Biblioteca Nacional
É o projeto “Cientista Que Virou Mãe – maternidade, ciência, ativismo e noites em claro”, um projeto interativo de livro, escrito por mim a partir de temas sugeridos pelas mulheres dos grupos que participo. Ou seja, embora seja escrito a duas mãos, representará o coletivo de centenas delas. 
De mãos de mães, de mulheres, de cientistas, de ativistas, de simpatizantes, de gente que também trabalha nas madrugadas. Composto por 5 capítulos que abordam diferentes temas sobre os quais trato neste blog, proposto para ser realizado em 6 meses e que pode dar origem a um livro em formato impresso ou eletrônico. Então ontem saiu o resultado da primeira fase do processo de seleção e o projeto foi considerado habilitado para concorrer ao financiamento. Agora ele vai para a segunda e última etapa.
Estou muito feliz, muito mesmo. São centenas de projetos literários do Brasil inteiro, são apenas 30 bolsas, sendo apenas 5 para a Região Sul do país. Será difícil ser selecionada, obviamente. Mas ainda assim já estou muito satisfeita por ter tido coragem e organização para submeter a ideia a uma avaliação dessas. E ainda que eu não consiga a bolsa para produzi-lo, agora o projeto está escrito e não é impossível que eu toque a ideia, ainda que sem o financiamento… Afinal de contas, foram as ideias aparentemente malucas, porém cheias de significado, que me trouxeram até aqui.
Participação no Forum de Medicalização, segunda etapa do Edital de Criação Literária da Biblioteca Nacional e finalista do Prêmio Top Blog 2012. E tudo porque eu cavo tempo, na madrugada, para escrever o que eu penso e vivo, aqui, em um blog.
Ter um posicionamento definido sobre as coisas não é tarefa das mais fáceis e muitas vezes traz bastante aborrecimento. 
Mas se vale a pena?
Sempre. Cada minuto dedicado. Cada palavra escrita.
Desde que não seja com indiferença.
“Ou escreves algo que valha a pena ler, ou fazes algo acerca do qual valha a pena escrever” – Benjamim Franklin.
Se você conseguir as duas coisas, então… 
“Não se pode escrever nada com indiferença”
Simone de Beauvoir

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