No domingo, falei sobre meus sentimentos a respeito da entrada na minha filha na escolinha às vésperas do seu primeiro dia, e do que isso representa pra mim. Na segunda, contei como foi o primeiro dia, eu estando com ela para sua adaptação, com direito a cocô, empurrão, pizza e trabalho com lã. Na terça, foi a vez do pai dela estar junto, vivenciando a experiência de salvá-la de uma paulada na cabeça e sendo testemunha do abraço coletivo que ela ganhou dos novos amiguinhos quando começou a chorar.
E então ontem foi o dia D. 
Aquele que temi durante 2 anos, 1 mês e 12 dias: o dia de levá-la, ficar um pouquinho, me despedir e deixá-la por um período aos cuidados das professoras.
Na madrugada anterior não consegui dormir nem por um decreto. Eu dizia que não era tensão, que era falta de sono mesmo.
Nada. Cagaço puro.
Como é que pode, né? A mulher passa mais da metade da vida dentro de ambientes escolares e se borra com a ideia de deixar a filha em um… É. É assim. Filho é filho, pronto e acabou. 
Então dormi umas poucas horas. 
E acordei com a vozinha dela bem no meu ouvido, falando baixinho, como ela sempre faz.
Ela veio de mansinho e disse:
“Mamãe, no qué colinha”.
Oi?
Bem isso.
A primeira frase que ela me disse nesse dia decisivo foi “No qué colinha, mãe”.
Abri os olhos meio no susto e disse: “Ô filhinha, mas por que você não quer ir para a escolinha?”. 
“No qué”. 
Então fiquei um pouquinho na cama com ela falando de todo tipo de assunto – menos da escolinha. Deixei esse assunto pra lá, não dei  maior atenção.
Nos levantamos e fomos cuidar da vida.
Então fiz sua malinha. Enquanto guardava as coisas dentro, pensava: “Não tem nada a ver esse negócio de fazer mala de filho. Nada a ver. Ela tem 2 anos e 1 mês. Eu tô louca? Onde eu tô com a cabeça?! O lugar dela é aqui. Isso é loucura“. Mas para eles eu sustentava uma cara otimista, no maior estilo: “Oba! Hoje é dia de escolinha!”. Falsa.
E chegou a hora de irmos.
Frank foi falando sobre todos os assuntos universais. E eu sem querer conversar. Acho que numa medida desesperada, chegou até a narrar uma cena de morte que um amigo dele viu no trânsito. Só dei aquela olhada seca. Ele entendeu. Mudou de assunto. Falou do clima… 
Clara foi dizendo de casa até a escola que “No qué colinha”. Eu querendo me atirar janela a fora com o carro em movimento. “E essa agora, meu Deus?”.
Então, depois de deixarmos o pai dela no trabalho, chegamos em frente à escola. Como por um passe de mágica, ela: “Obaaa! Colinha, mamãe”. Vai entender…
Entramos. Ela foi direto para as professoras e os amiguinhos, que brincavam na areia. 
Cumprimentei as professoras e fiquei ali, com cara de nada.
Então uma delas sugeriu que eu sentasse um pouco numa das cadeirinhas e perguntou: “E você, como está? Está segura pra deixá-la?”. “Claro que não” foi minha resposta sincerona. Caímos na risada. Ficamos ali filosofando mais um pouco, rindo, conversando sobre as crianças, ainda pude interferir numa atitude brusca da Clara com uma criança menor, voltei e ali fiquei.
Então, depois de uns 15 minutos, decidi que era a hora.
Perguntei para a professora como deveria fazer, que hora buscar, o que fazer (quem eu era, o que estava fazendo ali, por que o mundo era assim, qual era o sentido da vida, mimimimi). 
Ela disse que eu podia ir e, caso ela não se adaptasse muito e chorasse, me ligariam rápido. Mas que se se adaptasse bem, era para deixá-la até umas 16:30 e não o período todo, pra não pesar muito.
Lógico que rolou o momento “pergunta cretina do dia”: “Mas você liga meeeeesmo?”. MÃES.
Então levantei, respirei, ainda sussurrei um “caramba” e fui em direção à Clara, que brincava ali perto.
Abaixei e disse: 
“Filha, mamãe vai sair agora, mas vou estar bem pertinho. Daqui a pouco volto pra te buscar, tá?”.
Aqueles segundos tenebrosos de tensão.
Então ela vem, me abraça, me dá um beijo e diz:
“Tá, mamãe. Tchau, beijo”
…….
“Tá filha?”
“Tá mamãe, beijo” –  e me dá outro beijo.
“Tá filha?!” (tipo: não vai morrer como eu tô morrendo?! cadê o drama dessa vida, minha gente?!)
E ela já não estava mais ali, já tinha ido brincar… Ainda deu uma viradinha e me deu tchau com as mãozinhas.
Olhei para a professora com a maior cara de QUIÉISSO?!.
E então fui.
Fechei o portão, abracei meu amigo que acabava de chegar trazendo o filho, amigão da Clara, comemoramos, entrei no carro sorrindo, liguei o carro e fui.
Andei uns 50 metros e precisei parar.
E então…………………… tive a maior crise de riso dos últimos meses.
Sem brincadeira. 
Uma crise de riso daquelas de chorar. Mas daí o choro do riso começou a ficar esquisitinho, virou um choro de emoção, uma coisa meio estranha, rindo e chorando ao mesmo tempo, super Jerry Lewis. Mães, essas bizarras. 
Então eu chorei um pouquinho de emoção, de alegria, de satisfação, de contentamento. 
Liguei pro Frank. Contei. Liguei pra minha mãe. Contei. Liguei pra amiga. Contei. Queria tocar a campainha da casa ao lado pra contar também.
Foi uma das maiores alegrias que já senti nessa vida de mãe.
Então, quando parou a doideira, pensei: “E AGORA?! SOU EU COMIGO?! O QUE EU VOU FAZER NESSA TARDE?“. Estava ao lado da universidade, mas obviamente não tinha cabeça para intelectualidades.
Ainda fiquei um pouquinho parada ali, pensando, me sentindo, me observando.
E então, decidi.
Fui buscar meu namorado – não o pai da minha filha, não o meu marido, o meu namorado mesmo – para um café comigo, para ficarmos juntos e conversar sobre QUALQUER OUTRA COISA DO UNIVERSO, menos de filho e de escolinha. E passear de mãos dadas sem sling ou sem um estar correndo à frente pra impedir que uma menina linda de chiquinhas fosse embora de nós
Então, estando os dois vestidos de vermelho, nos demos as mãos, e fomos passear.
Pedimos um café, sentamos numa mesa, nos olhamos e… falamos dela.
Mas falamos só um pouquinho, porque essa mãe aqui, adepta da criação com apego, com vínculo ou qualquer outro nome, sabia que era a hora de deixá-la viver aquele momento – e de viver esse também. 
Obviamente que o celular estava à minha vista, com toque no último volume, para o caso de alguém me ligar solicitando que eu fosse buscá-la.
Mas então ninguém me ligou.
Ainda fui fazer mais algumas coisas e ninguém me ligou.
Passei na universidade e ninguém me ligava.
Eu me segurando pra não fazer vergonha e mandar mensagem e ligar e tal. 
Quando, às 16:00, chega uma mensagem: “Clara está super bem“. 
Às 16:30, voltei para buscá-la.
Abri o portão, entrei e a vi correndo, desca
lça, pé na terra, calças arregaçadas até os joelhos, suando, feliz. Ela me viu, disse: “Oi mamãe!” – e continuou a correr. Uma das professoras estava ao meu lado e ainda perguntou: “Ela te viu, deu tchau e continuou a brincar?!”. E eu: “Arram” – como quem diz “É, eu sei, também estou chocada”.
Daqui a pouco veio com tudo correndo e se jogou nos meus braços.
Eu a abracei muito, beijei muito aquele cabelo suado e aquele rosto vermelho de brincar e perguntei: “E aí, filha? Foi bom?”
“Legal colinha, mamãe”.
“Vamos embora então, filha, pra gente voltar amanhã?”
“No qué bora, mamãe”.
Precisei esperar uns 15 minutos até que ela quisesse ir. E então consegui tirar umas fotinhos. Fotos do dia em que minha filha se despediu de mim pra ficar na escolinha – não o contrário.

Precisei convencê-la muito bem a ir embora.
E só convenci porque prometi: hoje te levarei de novo, filha, como você me pediu.
E assim foi o dia, entre todos com ela até agora, que eu mais temi.
Dia de alegria, satisfação e muita paz no coração. Com aquele sentimento reconfortante de que estamos no caminho certo, de que está valendo a pena tudo o que está sendo feito, de que tomei as decisões acertadas e fiz boas escolhas.
Minha filha realmente está pronta. Então, agora, eu também estou.
Claro que ela não é um robô,  pode vir a sentir dificuldade nos próximos dias. Mas se isso acontecer, já superei o primeiro medo; estarei mais forte para ajudá-la. 
Sinto que ela está feliz. 
E está SEGURA. Cheia de segurança de que estamos com ela, ainda que ela não nos veja.
Às 9 da noite ela já estava dormindo.
E dormiu a noite inteira……
Então finalizo essa trilogia cheia de emoção e sinceridade com as palavras do Rubem Alves, que sussurrei sozinha no carro depois que passou a minha crise bizarra de riso:
“Amar é ter um pássaro pousado no dedo. 
Quem tem um pássaro pousado no dedo sabe que
a qualquer momento ele pode voar”
Obrigada a todos os amigos que me deram força e motivação pra viver esses dias. Obrigada pelas tantas mensagens alegres e emocionantes que recebi. À minha mãe, que tem me apoiado tanto. 
Ao Frank, pela camiseta vermelha de hoje, pela torta de morango e pelo presentinho que me deu “para me ajudar na MINHA adaptação”
Às professoras que estão nos acolhendo com tanto carinho.
E à minha filha.
Por confiar tanto em mim. Em nós.

Leave a Reply