A história de hoje é uma longa e especial história, que vale muito a pena reservar um tempinho para ler…
Todos os dias, centenas de pessoas passam umas pelas outras sem se darem conta de que ali, passando por elas, também podem estar companheiros em potencial. O cotidiano agitado, aliado a essa época de extremo individualismo e de pessoas que mais pensam em seus próprios interesses que no bem coletivo ou no outro como ser que merece respeito e consideração, torna as pessoas praticamente invisíveis quando elas são explicitamente visíveis e presentes.
Por outro lado, por mais paradoxal que pareça ser, o mundo virtual muitas vezes traz para nosso convívio pessoas sem um corpo físico presente, mas que se tornam extremamente presentes por suas ideias, pelo compartilhamento de experiências e pela semelhança de valores.
Assim é com os blogs, assim é com as mídias sociais.
É lógico que tem muito babaca usando essas formas de comunicação apenas como se fosse seu diário adolescente. Mas, pelo menos no que diz respeito ao meu círculo de contatos virtuais, uma grande parte as utiliza para trocar informações úteis, para formar redes de ativismo em prol de causas coletivas (sim, somos ativistas, e é uma pena que algumas pessoas autocentradas pensem que isso é ruim) e para divulgar conceitos e ideias que, de outra forma, estariam restritos a determinados grupos e a poucas pessoas.
Não há como negar que a internet tem aproximado pessoas que, de outra forma, talvez nem pudessem se conhecer. E a internet não é mais algo elitista, não.

O Internet World Stats afirma que o Brasil é líder em acesso na América do Sul e que, apesar da desigualdade de renda, apresenta um grande crescimento diário com relação às residências com computadores conectados à rede. Com relação ao uso diferencial por gênero, Heleno Schneider diz, em seu trabalho de mestrado “Diferenças entre homens e mulheres no uso e na percepção de valor da internet“, que são as mulheres quem, de maneira geral, mais destacam a importância da internet como ferramenta de comunicação, enquanto os homens a utilizam mais para a busca de informações. A própria UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) considera a internet como uma ferramenta crucial para o empoderamento de mulheres.
Eu estou entre essas que se empoderam diariamente também através da internet e a utilizo como fonte de informação, de transformação desta informação em conhecimento, de relacionamento social, de trabalho, de cultura, de criatividade, de auxílio e apoio como mãe, para me comunicar com meus familiares, entre tantas outras finalidades que essa incrível rede virtual nos possibilita.
Mas por que raios estou falando sobre isso?
Porque na semana passada, passei por uma experiência muito especial. Uma história que começou faz tempo, de maneira muito sutil, e que se tornou um momento de confraternização e de descoberta de novos amigos.

Um dia, ainda grávida, fuçando na internet como sempre, encontrei um livro digitalizado que estava procurando há meses e que encontra-se esgostado nas livrarias já há muito tempo. O incrível livro Quando O Corpo Consente, que li ainda grávida, mudou minha forma de ver a gestação e o mundo novo para o qual ela nos abre, e, desde então, recomendo aos quatro cantos, principalmente se nesses cantos estiverem barrigudas à espera de seus filhos.
Pois bem. Aí eu recomendei o livro em uma lista de discussão da qual faço parte. E nessa lista estava uma pessoa que coeditava um blog. Coeditava não, coedita. Este blog é editado por duas mulheres, duas mães. E aí essas mulheres também indicaram no blog esse livro. E o indicaram em 30 de julho de 2010, sem saber que, naquele exato momento, eu estava em trabalho de parto.
Essas duas mulheres, Ana Carolina Franzon e Bianca Lanu, são mães, estudiosas da questão do respeito ao parto e nascimento e coeditam o excelente Parto no Brasil, que eu recomendo a todo mundo que se interessa pelo tema.
Aí o tempo se passou e, em 06 de novembro de 2010, Clara com 3 meses de vida, elas lançaram um sorteio em parceria com minha amiga Gabi, da Ninho Slings. Ana Carolina entre Londrina e SP, Bianca em Cananéia-SP, eu e Gabi em Floripa. Eu, slingueira convicta e adicta, resolvi participar desse sorteio, mesmo sem nunca ter ganho nem pano de prato em bingo de igreja. E ganhei!
Aí enviei meus dados para a Bianca, para que ela divulgasse lá. E, desde então, sutilmente, temos mantido contato.
Nosso contato virtual, via Facebook, se intensificou após minha inserção absoluta no mundo da pesquisa e interesse sobre partos humanizados e tudo o que gira em torno disso. Ela posta, eu compartilho, eu posto, ela comenta, trocamos informações muito úteis, trocamos ideias, compartilhamos infos sobre editais que podem interessar às duas, babamos nas fotinhos da filharada e tudo o que essa forma de comunicação nos permite.

 A Bianca escreveu um livro (outro, porque ela já é uma escritora experiente), que é justamente o que estou lendo agora, como meu livro de cabeceira no início dessas férias, o Parteiras Caiçaras, que mencionei no post anterior. E decidiu fazer um curso com a midwife mexicana e referência no assunto Naoli Vinaver, que agora mora aqui em Floripa. Aí juntou o curso em Floripa com o lançamento de seu livro sobre parteiras e pimba! Pintou a ideia! Não sei se partindo de mim ou dela, surgiu a ideia dela vir lançar o livro no Bazar Coisas de Mãe nos dias em que estaria aqui por conta do curso. 
Um certo dia, ela me pergunta: “Ligia, você conhece algum lugar onde possa me hospedar?“. Lembro de ter respondido, primeiro, algo como “Posso procurar pra você“. Mas aí parei e me toquei: puxa, nós temos um quarto aqui onde ninguém dorme à noite; puxa, ela é uma parceira e companheira de ativismo… E respondi, na lata: “Bianca, se você quiser, pode ficar aqui em casa numa boa“.
E então, 2 meses depois, Bianca chegou à Ilha da Magia. Fui buscá-la na rodoviária e foi só olhar pra ela e sentir que já éramos amigas há muito tempo, sem nem termos nos visto antes.
Ela passou alguns dias aqui, em nossa casa. Foram ótimos dias, dias alegres, de identificação, de muita prosa, de muitas risadas e cafezinhos bem passados. Coisa de – como ela gosta muito de dizer – comadre. Coisa de comadre mesmo. E compadre, porque ela e Frank ficaram muito amigos também, conversaram muito e trocaram muitas ideias na sacada de casa, enquanto eu dava conta dos últimos trabalhos do semestre. Gente querida que recebemos em casa com muito amor, e que deixou mais amor ainda. Clara a adorou, e ela aproveitou pra matar um pouquinho a saudade do Rudá, seu filho de 2 anos, que ficou com o paizão enquanto ela fazia o curso.
Antes de ir embora, Bianca me deu um presentinho muito simbólico: uma canequinha de metal parecida com essa que ela está usando na foto, para que eu possa tomar os meus cafezinhos que tanto gosto enquanto escrevo e me lembrar dessa comadre que está há alguns quilômetros de distância, mas com a proximidade de um clique.
Bianca foi embora e deixou aqui não somente saudade, mas uma família contente por mais uma amiga, feita dessa maneira tão especial.
Depois que ela se foi, me toquei: conversamos tanto que não lembramos nem de tirar uma foto juntas, quase imperdoável. Mas essa fotinho aí da Clara comigo foi ela quem tirou…
Bem, minha relação com essas mulheres desse blog tão bacana não termina por aí.
Enquanto Bianca se preparava para vir a Floripa, um outro vínculo se formava, agora com a Ana Carolina. Em reunião com meu orientador de doutorado, chegamos à conclusão de que, dada a grande procura das mulheres pela pesquisa que estamos desenvolvendo sobre violência obstétrica, e considerando a grande importância deste tema, seria muito importante se pudéssemos contar com a colaboração de alguém de relevância nessa área no Brasil. Um primeiro nome nos veio logo à mente, a professora Simone Diniz, livre-docente do Departamento de Saúde Materno-Infantil na Faculdade de Saúde Pública da USP, e referência no Brasil em pesquisas sobre respeito ao parto e nascimento. Justamente em função disso, senti-me um pouco constrangida em fazer esse convite a ela, que também só conheço virtualmente em função da qualidade de seu trabalho. Mas lembrei-me que a Ana Carolina é atualmente sua aluna de pós-graduação. Escrevi pra Ana perguntando o que ela achava disso, e ela, muito carinhosamente, me incentivou e motivou a escrever à Simone. Assim fiz. E imagine a minha surpresa ao receber sua resposta, não somente aceitando meu convite para uma co-orientação, mas elogiando nosso trabalho e iniciativa. Então, hoje, tenho a grata satisfação de ser colega da Ana, começando um trabalho junto ao mesmo grupo – e outras parcerias que estão sendo gestadas com carinho e cuidado.
Bom, a Bianca já foi embora há quase uma semana. Por que, então, estou escrevendo sobre isso somente hoje?
Porque hoje o Parto no Brasil está comemorando 2 anos de existência, com mais de 100 mil visualizações. Mas não é por isso que eu homeageio esse blog hoje. Mas porque ele ajuda a levar informação de qualidade a centenas de mulheres, porque ele tem uma função muito bem desempenhada nessa missão de buscar o respeito às mulheres em suas gestações e partos. E porque foi por meio dele que hoje eu faço parte desse comadrio tão especial.
Ana e Bianca, parabéns pelo lindo e voluntário trabalho em coeditar esse blog. E obrigada por isso!
Pra finalizar, deixo exatamente as palavras que elas escolheram para abrí-lo, em sua epígrafe:

 “A Vida não é canal aberto com régua e esquadro.
É rio poderoso e caprichoso
mas que nem por isso deixa de encontrar
o mar de onde nasceu,
mar ao qual todo rio aspira,
mar que acabam todos,
sempre,
por reencontrar.”
Frédérick Leboyer. Se me contassem o parto.
(Ed. Ground, 1998)
E compartilho, também,  a entrevista da Bianca ao Canal Futura, sobre seu lindo e emocionante livro, que comecei a ler e estou adorando.
Quem acha que a internet é bobagem e perda de tempo, ou não sabe usá-la direito ou não sabe de nada…

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