Sabe… Eu tenho 32 anos. Já sou mãe e tudo, como vocês sabem. Tô véia já. E continuo sendo a mesma maria-moleque que sempre fui, desde a minha infância no Jardim Maria Cecília.
Eu não sei de onde veio isso, mas eu tinha mania, quando criança, de assustar os outros. Não podia ouvir falar que fulaninho tinha medo do sobrenatural que já ia lá assustar o pobre.
Que diga minha irmã Livia, que sofreu horrores comigo. Ela morria de medo do lobisomem da novela Roque Santeiro e eu vivia cantando, atrás dela, “mistérios da meia-noite, que voam longe…”. Às vezes, depois que minha mãe nos colocava para dormir, eu me arrastava pelo chão, tipo um ser rastejante mesmo, ia até os pés da cama dela e, de repente, agarrava o pé da coitada. Era um deus-nos-acuda, e eu sempre acabava tomando umas piabas. Morrendo de rir, mas tomava. Não sei nem como minha irmã conseguiu crescer sem traumas e ser minha amiga hoje.
Bem, o fato é: eu juro que não sei porquê, mas continuo fazendo isso. O coitado do pai da Clara que o diga… Por que será que toda pessoa atentada acaba encontrando na vida alguém que tem medo do sobrenatural?
Uma amiga dele nos emprestou uma babá eletrônica que tem sido de muita ajuda, porque como ela dorme bem antes de mim e eu tenho hábitos noturnos, posso tocar a vida sem ter medo de não ouvi-la chorar (ainda mais considerando que eu sou meio surda…). Então eu a faço dormir, coloco no quarto, ligo a babá eletrônica, encosto a porta e toco a vida sem medo de não ouvi-la. O receptor fica do lado dela e o transmissor fica na cozinha.
E o troço é supersônico!
Pega até a respiração da bebê.
Mas o caso é que, estando sem ter o que fazer da vida, inventei para ele uma história de que fulana de tal tinha uma babá eletrônica e, um belo dia, a fulana estava tocando a vida quando ouviu alguém conversando com a bebê. Chegou no quarto e não tinha ninguém.
Pra quê fui fazer isso?
Agora toda hora é hora de cagaço… Quando vejo, tá lá o pobre quieto tentando ouvir algum barulho dentro do quarto.
Mas hoje foi demais.
Clara foi dormir às 8 da noite, depois de tomar um banhinho gostoso e mamar. Ela acorda a cada 3 ou 4 horas para reabastecer o tanque. Quando eram 11 da noite, ela deu uma reclamadinha e eu fui lá. Peguei a fofa no colo e dei o tradicional mamazinho da noite. E ele lá, do lado de fora, fazendo não sei o que.
Mas o tal do não sei o quê fazia um barulho danado, que ia acordar a bebezinha. Quer deixar uma mãe louca e em ponto de tiro é acordar bebê que está dormindo… Então, lembrei-me da supersoniquice do aparelho. Fui bem pertinho do receptor e cochichei: “FE-CHA A POR-TAAAAA”.
Na sequência, ouvi passos de corrida, porta abrindo, porta fechando e o barulho parou.
Bom, estou procurando por ele até agora…
Saiu correndo de medo e ainda não voltou.
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Grata.