Todas as vezes que preciso me acalmar, procuro uma imagem de mim mesma em alguma época da vida fazendo alguma coisa que tenha me dado muito prazer. E sempre me vem a mesma imagem. Virou uma referência pra mim, a ponto de me pegar tantas vezes pensando: “Ai que saudade daqueles dias”.
Já analisei aqueles momentos buscando o que tinha de especial neles. Pessoas, palavras, cheiros, sensações, objetos, tudo. Escaneei o quadro. Sabe o que tinha lá de especial?
Eu.
Juro.
Não tinha ninguém mais.
Era só eu. Eu, deitada numa rede pendurada na sala, o Caetano Veloso cantando, a porta da sala aberta, luz de um dia ensolarado entrando, chinelo e um vestidinho bicho-grilo verde manchado de branco que eu amava. Era isso que tinha. E dentro de mim, uma paz e uma alegria incríveis.
Era isso.
Nunca mais eu consegui chegar naquela sensação. Porque até hoje eu não sei o que realmente me fez tão bem daquele jeito. Eu pintei parede, eu pintei móveis, eu cantei, caminhei, plantei mudas, cuidei de um coelho, escrevi, bom demais.
Por que estou falando nisso? Porque aquela sensação virou uma referência pra mim. Sempre busco alcançar aquele sentimento. Sabe há quanto tempo foi isso? Onze anos…
A questão é a seguinte: voltei a sentir aquela sensação há alguns dias… Há uns 4 dias.
Entrei num túnel de boas vibes e não sei exatamente como.
E essa boa energia tem me levado a leituras pertinentes ao momento.
Gosto da Martha Medeiros. Já falei isso trocentas vezes. Li um texto dela nessa semana que dizia:

“Pô, como é que dá pra confiar numa criatura dessas? [se referindo a pessoas que mudam de opinião a respeito das coisas]. Pois dá. Aliás, é mais confiável uma criatura dessas do que aquela que se algemou a meia dúzia de “verdades” inabaláveis, que não muda jamais de opinião, que registrou em cartório sua lista de aversões.”

Mais um cadinho…

“Mudanças não significam fragilidade de caráter. É preciso ter uma certa flexibilidade para evoluir e se divertir com a vida. Mais ainda: essa flexibilidade é fundamental para manter nossa integridade, por mais contraditório que pareça”.

E, por fim…

“O fato de transgredirmos nossas próprias regras só demonstra que estamos conscientes de que a cada dia aprendemos um pouco mais, ou desaprendemos um pouco mais, o que também é amadurecer. Não estamos congelados em vida. Podemos mudar de idéia, podemos nos reapresentar ao mundo, podemos nos olhar no espelho de manhã e dizer: bom dia, muito prazer. Ninguém precisa ficar desconcertado diante de alguém que se desconstrói às vezes.” – o grifo é meu tá?

Estou me desconstruindo nos últimos tempos. Tô me sentindo um lego. Tiro daqui, boto ali, tiro peça, coloco mais uma, deixo uma de lado pra pensar onde é que vai ficar…
É bom ser flexível. É ótimo não ser rígido. Aliás, as pessoas que mais me magoaram na vida tem uma característica em comum: são pessoas dotadas de absolutas certezas a respeito de tudo. De opiniões duras e inflexíveis. Não mudam de caminho nem de opinião. Ui! Cruzes! Chega a dar uma ziquizira até… Pé de pato, mangalô, três vezes! Que venha a celulite, mas rigidez de opinião, Senhor Jesus, me livre disso!
Eu tenho um grande amigo, que não vejo há 5 anos, que tinha uma camiseta linda onde estava escrito: “Quem não muda de caminho é trem”. Sempre falo essa frase em função de ter lido lá…
E é mais ou menos isso o que quero dizer hoje.
É legal não ser rígido. Principalmente consigo mesmo.
Gostava de uma coisa e viu que ela não é pra você? Sem crise, tudo bem. Deixa ela ir e segue em frente… Era católico mas tá gostando do espiritismo? Tudo bem, Deus é bom em todas elas, relaxa, ele não vai te punir… Bebia e não bebe mais? Qual o problema? Gostava de alguém mas descobriu que te fazia mal? Que bom que descobriu! Vambora, sem crise!
Mudar é bom! (se a Carol me ouvisse dizendo isso agora, acho que teria uma convulsão…)

Como disse a Martha, não precisa ficar desconcertado diante de alguém que está de desconstruindo e se reconstruindo. Ainda mais quando essa pessoa está se reconstruindo utilizando somente seu próprio material, e não o material de outra pessoa. O que é muito mais seguro e confortável! Porque se essa pessoa, por ventura, partir da sua vida, ela não leva você junto, desmoronando tudo… Pode doer um pouco a partida, mas no fim a estrutura estará lá, inteira. Nada que uma massa corrida não dê jeito.

É isso. Andei me desmoronando aí, mas já estou na reconstrução. E dessa vez, na arquitetura que eu quero. Que já não era sem tempo… Estou nesse processo autopoiético de auto-organização. De auto-criação. De auto-reconstrução. E tá legal. Tenho passado algumas impressões minhas a algumas pessoas e estão gostando também. Porque uma coisa é fato: não adianta você criticar o outro ou o mundo se você não tem feito coisas bacanas também. O videozinho acima diz mais ou menos isso. Quer gente legal? Quer gente bacana? Veja bem se você tem sido legal e se está à altura desse povo…

PS: autopoiese, de acordo com Humberto Maturana e Francisco Varela… dá uma fuçadinha nisso que vale a pena. Não é porque eu sou bióloga não. É porque é bom mesmo.

Leave a Reply