E além de criticar? O que você tem feito para que isso mude?

Educação é questão estratégica para um país? Educação é motor de arranque para a mudança, presente e futura? Educação é direito do cidadão? É dever do Estado? Como vai a educação no Brasil? Qual a condição de grande parte das escolas brasileiras? As crianças e jovens vêm recebendo educação emancipatória, educação problematizadora, verdadeira educação dentro das escolas brasileiras? E de quem é a culpa? Há culpa?

Nos dias correntes, marcados por numerosas e efusivas manifestações “em busca de direitos”, todos parecem ter respostas prontas para cada um desses questionamentos. Mas, como tudo aquilo que vem fácil demais, com frequência são respostas que carecem de maiores problematizações, aprofundamentos, verdadeiras reflexões e inclusão de múltiplas dimensões.
É também por isso mas não só, que tenho verdadeiro apreço pela pergunta que vem a seguir. O que você tem feito verdadeiramente pela melhoria da educação brasileira? O que nós temos feito?
Por incrível que pareça, muita gente tem respondido a essa pergunta com a ingênua resposta: “EU TENHO VOTADO! É isso o que eu tenho feito! Já faço a minha obrigação votando! Que os políticos façam a sua!“. Isso é, por si só, um exemplo claro e fatídico da qualidade da educação no Brasil: produzindo gente que prefere omitir-se da ação, reflexão e posicionamento. E, como disse Bertolt Brecht, “O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos“. Votar não basta para haver participação política. Nem tampouco para exercitar a democracia. Muito menos para o exercício da cidadania. Isso, tudo isso, fazemos ou deixamos de fazer todos os dias, no silenciamento que produzimos sobre assuntos tão relevantes ou na amplificação de vozes e temas que dizem respeito à coletividade. Votar é praticamente nada quando não se fiscaliza, exige e acompanha a atuação de quem elegemos. Quando não se investiga a história e o verdadeiro comprometimento de quem se elege. Quando se acredita que problemas sérios como a estrutura educacional de um país se resolverão de uma hora para a outra, sem a participação e envolvimento popular.

Os professores da rede estadual de São Paulo estão em greve desde 16 de março. Na assembleia da última sexta-feira, 27/03, decidiram manter a greve em função da insuficiente (ou ausente) proposta do governo do estado. A APEOESP (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo) contabiliza mais de 60% de profissionais paralisados. Enquanto isso, o governador do Estado afirma que não há greve, que 2% de profissionais paralisados não representa greve. E quando nós, que trabalhamos com divulgação de informação, divulgamos isso, não há discussão produtiva ou producente. Há tiro, porrada e bomba por parte de um pessoal que parece muito pouco interessado na mudança, na real mudança, embora pareça muito interessado na confusão, na propagação do ódio e na ofensa gratuita. Talvez numa tentativa de silenciar as pessoas. De silenciar as exigências populares. Fazer isso é uma coisa só: compactuar com todos os problemas educacionais que as crianças brasileiras vêm sofrendo. Compactuar com a falta de professores, com a precariedade estrutural da escola brasileira, com a baixa remuneração dos profissionais da educação, com a falta de qualidade da educação oferecida. E quando nos tornamos comparsas, então não é muito coerente ir às ruas clamar por mudanças, porque a mudança que deveria partir de nós não parte e estamos sendo hipócritas. Toda tentativa de silenciamento é, também, forma de violência. Silenciar pessoas que lutam por direitos e pela disseminação de informações relevantes a toda a coletividade, visando sua emancipação, é prática corrente de regimes ditatoriais e que desrespeitam a democracia. Por esse motivo, abaixo segue um texto escrito por professores. Da rede estadual paulista. E sobre a greve que, sim, existe.

Se você não vê, ou é cego ou está muito mal intencionado.
Porque, citando Brecht mais uma vez, “Aquele que não conhece a verdade é simplesmente um ignorante, mas aquele que a conhece e diz que é mentira, este é um criminoso“.
Se nós queremos que nossas crianças, todas elas, tenham acesso a uma educação verdadeiramente emancipatória, digna, que valorize o humano, é preciso que apoiemos quem está sendo negligenciado. A luta pela educação de qualidade começa com o não silenciamento e com a rejeição à negação dos problemas.

Por que os professores cruzaram os braços?
                  
Marco Antonio Milani, professor e mestre em História pela Unesp – Assis
Vanessa Pultrini Rovaris, professora da rede pública estadual paulista


É comum ver na televisão imagens do caos na educação pública: brigas entre alunos, agressões a professores, escolas caindo aos pedaços, indicadores de qualidade decrescentes. Só isso seria um motivo para os brasileiros não só se indignarem, mas também se empenharem na mudança da educação.
Mas o cotidiano das escolas é muito mais perverso que isso. Um jornalista que se dispusesse a se passar por um professor substituto em uma escola estadual descobriria que as salas dos professores são um dos lugares mais deprimentes desse país. Antidepressivos e ansiolíticos costumam ser o tema principal das conversas ali. Os professores estão doentes.

As condições de trabalho são pra lá de degradantes nas escolas públicas de todo o país. E no estado mais rico da Federação não é diferente. Pior do que não saber ao certo quanto se vai receber no final do mês é saber que, no final do bimestre, seu trabalho não valeu de nada.
Não há, em nenhum lugar do mundo, uma resposta para como adequar a escola à realidade dos jovens de hoje. Mas, sem dúvida, há modelos de educação pública que funcionam melhor. Poucos brasileiros sabem, mas seu país tem educadores conhecidos mundialmente. Entretanto, nem suas teorias nem as de qualquer outro país podem funcionar nas nossas escolas sem que todos os profissionais da educação tenham condições de aplicá-las.

No Estado de São Paulo, desde o final do ano passado, agravou-se a já preocupante falta de recursos de todo o tipo. Falta de papel higiênico até professores, além de espaço físico. Há salas de aula com o dobro do número de alunos permitido por lei. Mas a ordem silenciosa que se ouve diariamente nos corredores é que os alunos sejam mantidos dentro das salas a qualquer custo.
Podemos oferecer remédios tarja preta aos professores, podemos pedir que os alunos tragam papel higiênico de casa e continuar fingindo que tudo vai bem. Mas quem ganha com isso? Se perguntarmos para qualquer pessoa que estiver passando na rua qual a importância da educação, ela terá uma resposta na ponta da língua. Mas não bastam palavras bem escolhidas, em slogans de governo ou na boca do povo, se não há ações concretas para construir uma educação digna para nossas crianças.


É em nome disso que os professores das escolas estaduais de São Paulo estão cruzando os braços. Se falam em melhor remuneração e em melhores condições de trabalho é porque estão preocupados com os nossos filhos – ou, como diria o educador José Pacheco, com os filhos dos nossos filhos. Se não estivessem, seria mais fácil fingir que nada acontece ou simplesmente mudar de emprego. Os professores estão cruzando os braços, para que possam levantá-los com orgulho, amanhã. O orgulho de um trabalho bem feito, o orgulho de construir o futuro.


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