No dia 08 de março, Dia Internacional da Mulher, o CNPQ (Conselho Nacional para o
Desenvolvimento Científico e Tecnológico) divulgou um grande avanço para as cientistas brasileiras. As bolsistas de Produtividade em Pesquisa (bolsa que atende pela sigla PQ) ganharam direito a um ano a mais de bolsa quando derem à luz no período de vigência da mesma.

Segundo a instituição, a medida tem como objetivo impedir que as mães bolsistas interrompam suas atividades, além de incentivar o aumento da participação das mulheres no campo científico.
É importante ressaltar que essa categoria de bolsa é dada para quem já é doutora.
Ou seja, milhares de jovens cientistas em formação continuam descobertas quando fazem seus mestrados ou doutorados e engravidam no meio do processo, já que as bolsas não representam vínculo empregatício e não há qualquer tipo de amparo de legislação trabalhista que garanta sustento à jovem cientista, agora também mãe. E muitas mulheres passam grande dificuldade para resolver essa questão.
Na nota de divulgação do CNPQ há, inclusive, uma frase que me deixou bastante confusa. Eles afirmam que essa medida, que agora abrange as pesquisadoras PQ, “já estava implantada para as bolsistas de mestrado, doutorado e pós-doutorado“.
Até onde eu saiba, isso não é verdade. Não conheço qualquer legislação que garanta um ano a mais de bolsa para a jovem cientista que dá à luz durante o período de vigência da bolsa, nem nunca conheci alguém que tenha feito uso desse suposto benefício. Ao que eu saiba, existem, para mestrandas e doutorandas, 120 dias de licença remunerada, mas não 1 ano a mais de bolsa por ocasião de parto durante sua vigência. Posso estar errada, mas acho que houve equívoco de redação na nota…

A despeito de qualquer coisa, essa é realmente uma grande conquista. Principalmente quando sabemos que uma das principais barreiras que as mulheres cientistas enfrentam é, reconhecidamente, conciliar carreira e maternidade. Na nota de divulgação do CNPQ, há uma entrevista muito bacana com a pesquisadora Márcia Barbosa, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e presidente do Comitê Assessor de Física do CNPQ. Márcia diz, inclusive, que nas muitas conferências e debates internacionais dos quais participou, observou que essa questão de conciliar carreira e maternidade é uma questão universal.

Ano passado, dei uma entrevista ao jornal Correio Braziliense a respeito da participação feminina nos laboratórios de pesquisa e na ciência (entrevista na íntegra aqui). Naquela ocasião, falei sobre a inequidade nas relações de gênero na ciência brasileira, da representação desproporcional das mulheres e da dificuldade de se conciliar carreira e maternidade.

Se é difícil para as cientistas brasileiras que já compõem os quadros empregatícios das instituições de ensino e pesquisa e que, portanto, estão amparadas por legislação trabalhista que lhes garante benefícios associados à maternidade, imagine o que é para uma aluna de mestrado, doutorado ou pós-doutorado, que está sob supervisão hierárquica, conta com uma bolsa defasada (e olha que estamos recebendo reajuste a partir do mês que vem…) e não possui qualquer proteção trabalhista em caso de gravidez e parto… Porque os 120 dias de licença remunerada, bem… a gente sabe exatamente que na prática significa que há uma recém-parida trabalhando e cuidando de filho em casa, porque não é possível se dar ao luxo de parar por 4 meses e, ainda assim, concluir no prazo. Isso sem falar na pressão que existe sobre a aluna e no preconceito que muitas ainda vivem – e depoimentos mostrando isso não faltam…

Não, não é uma tarefa fácil ser cientista em processo de construção de carreira e ser mãe.
E eu posso dizer com o conhecimento de causa de quem já foi aluna de doutorado livre, leve e solta, sem filhos, e que agora é novamente aluna de doutorado com uma filha para criar. A diferença entre as duas situações é algo que mal posso colocar em palavras… Daria um longo texto somente sobre o assunto.

Mas embora se fale muito sobre essa tal dificuldade, o que pouco se fala é sobre a imensa satisfação de saber que é possível. Que damos conta do recado. Que conseguimos. Que temos uma fonte de inspiração quase inesgotável. Que desenvolvemos capacidades que antes sequer imaginávamos. Que praticamente duplicamos nossas horas diárias. Que transformamos qualquer hora em hora de estudo. E que estamos fazendo bem feito.

Quando fiz meu primeiro doutorado, tive contato com bem poucas mulheres que também eram alunas de pós e já tinham seus filhos. Eu as via fazendo malabarismos para conciliar horários, exigências e produção mas não tinha ideia do que era, nem me envolvia muito na questão. Hoje, com certeza em função da minha participação nas mídias sociais e da área de pesquisa onde atuo – direta e intensamente relacionada à maternidade – felizmente conheço dezenas de mulheres que estão conciliando pesquisa e maternidade. São muitas mulheres fazendo mestrado, doutorado e pós-doutorado enquanto criam seus filhos, ou criando seus filhos enquanto estudam e pensam em suas carreiras… E isso, para mim, é de uma riqueza de vida incrível. É um privilégio poder compartilhar tantas formas diferentes de conciliar essas duas áreas tão importantes da vida de uma mulher.

Se você está pensando em entrar nessa, esse texto, hoje, tem o único objetivo de te inspirar. De te motivar. De te encher de coragem e mostrar que é possível. São diferentes mulheres contando como vivem essa experiência ímpar de conciliar pós-graduação com criação de filhos. São diferentes soluções para tornar possível: apoio do marido, ajuda da mãe, mudança de horário de estudo, ajuda de cuidadoras quando o financeiro permite, entre outras. Cada solução acompanha a realidade de cada mulher. Mas o importante é mostrar que, à sua maneira, de acordo com sua realidade, É POSSÍVEL.
Porque se é preciso promover a equidade de gênero na ciência, se é preciso inserir as mulheres de maneira mais ampla no processo científico, então também é preciso inserir as mulheres mães. Principalmente as que estão construindo suas carreiras entre fraldas, primeiros passinhos e frases como “Mamãe, tá estudando? Posso estudar com você?

Ananda Etges

Comecei 2012 com notícias que encheram meus olhos de lágrimas: fui aprovada com bolsa em uma seleção de mestrado e estava grávida. Dois desejos importantes se tornavam realidade no mesmo momento e o desafio, sabia eu desde o início, seria conciliar o combo bebês (na época o meu primeiro filho tinha menos de 1 ano), vida acadêmica e trabalho. A modalidade da minha bolsa CAPES exige que eu termine o curso em 24 meses e não oferece nenhum auxílio financeiro, o que faz com que eu tenha que continuar trabalhando. Para conseguir ficar alguns meses em casa quando minha filha nasceu, tive que adiar algumas disciplinas. Agora que a Clara está com 4 meses, comecei a retomar as atividades, mas em ritmo lento, pois ela mama leite materno em livre demanda. Sempre que preciso ir para a universidade a levo junto, desde quando tinha 3 semanas. A carrego no sling ou deixo com alguma cuidadora (minha irmã ou minha avó). Amamento nos intervalos ou mesmo em sala de aula, durante as reuniões do grupo de pesquisa, por exemplo.Pedi demissão e optei por trabalhar em casa 25 horas semanais. Então, tenho muita dificuldade para manter um padrão de estudo. O que tenho feito é acordar antes das crianças (meu filho mais velho está com 1 ano e 9 meses), por volta das 7h. A dupla costuma levantar pelas 10h, então tenho um pouco de tempo para colocar as leituras em dia e escrever. Depois, à tarde, aproveito a soneca (quando os dois dormem ao mesmo tempo – coisa que nem sempre acontece) para o trabalho. Completo as horas de trabalho quando o marido chega (felizmente cedo, às 16h30min) com intervalo apenas para amamentar. É uma jornada longa, mas que tem funcionado. O que faz toda diferença é a participação e o engajamento do pai. A nossa dedicação conjunta é que faz dar certo.

Sabrina Neves

Engravidei no final do doutorado. Quando Marina nasceu, tinha que estudar, ler e escrever os artigos da tese. Atualmente, ela está com 7 meses e voltei a trabalhar, sou professora de uma federal e você imagina que sempre tenho que ler e estudar. Para fazer isso sem abrir mão da minha maternidade, leio e estudo sempre com minha filha dormindo. Pode ser na rede: eu a coloco em cima de mim e vou lendo. Outra alternativa foi o sling (principalmente para trabalhar no computador), que me serviu muito no começo. Hoje varo madrugadas, aproveito sonecas diurnas (acho que me adaptei a ter só 4 ou 5 horas de sono diárias, rsrsrs…). Mudamos também os horários de trabalho, o pai dela passou a trabalhar em casa 50% do tempo, eu saí da coordenação de alguns projetos e levo bastante coisa da universidade para fazer em casa. Dessa forma, garantimos que sempre tenhamos mamãe ou papai em casa. 


Fernanda Di Flora

Maternidade e pós-graduação: é possível!
Sempre sonhei ser mãe, mas era um daqueles sonhos bem distantes, a ser realizado só depois do  

mestrado, doutorado, pós-doutorado, e, quem sabe, depois de um período de trabalho com os Médicos Sem Fronteiras…rs

Então ia tudo muito bem nesse sentido até que em fevereiro de 2010 me descobri grávida, exatamente um ano após o ingresso no mestrado. Apesar do susto, a notícia foi recebida com muita alegria por mim e meu companheiro e logo cedo começamos o planejamento, não só da gravidez, dos preparativos necessários para receber nosso bebe, mas também o planejamento acadêmico, uma vez que eu estava exatamente no meio do mestrado e precisava cumprir com diversas obrigações, entre elas, a temida qualificação. Como minha filha nasceria em outubro, eu deveria apresentar minha qualificação em julho e defender a dissertação no mais tardar em março de 2011, resolvi adiantar o máximo possível o trabalho, porque já imaginava que nos primeiros dois meses de vida da pequena seria impossível me concentrar em qualquer outra coisa que não fosse nela (e, a bem da verdade, é difícil até hoje, 2 anos depois…).
Então essa seria a primeira dica para mães em situações e períodos similares: estando grávida, adiante o máximo possível o trabalho, ainda que o desejo de ler todos os assuntos relacionados à gravidez, parto, pós-parto, amamentação e afins seja irresistível. Foi fundamental ter feito isso (…).
Uma questão se colocou como fundamental nesse período: seria possível seguir os estudos (como havia anteriormente planejado) e conciliar a maternidade ativa, consciente e presente? Com o apoio fundamental do marido, decidi enfrentar o processo seletivo do doutorado, escrever um projeto, enfim…tudo isso sabendo que o processo aconteceria apenas um mês depois do nascimento de nossa filha e que eu provavelmente estaria exausta.
O projeto foi aprovado, fiz a entrevista e passei, apesar de ter ficado o tempo todo com a cabeça na Luizinha, que me esperava do lado de fora. E assim tem sido desde então: minha filha me acompanhando o tempo todo, em minhas atividades profissionais. Não foi diferente na defesa: eu lá dentro, defendendo meu trabalho, e ela lá, com o papai, me esperando! Foi muito gratificante ter o trabalho reconhecido, elogiado, recomendado para a publicação e indicado para um prêmio, porque para que pudesse concluí-lo com sucesso tive de abdicar de muitas noites de sono ao lado da minha princesa para poder estudar!
No início do doutorado, novamente com o apoio fundamental do marido, já que moramos em uma cidade onde não temos familiares ou amigos, pude cumprir os créditos sem ter de me afastar longamente da minha filha: ele, professor, flexibilizou seus horários para poder me acompanhar na Universidade, que fica em outra cidade. Saíamos de casa às 7:00h, chegávamos na faculdade às 8h, eu amamentava e ia para a aula (acordando, é claro, inúmer
as vezes durante a madrugada para amamentar). Foi essencial a postura compreensiva dos professores, conversei com todos eles explicando a situação e a possibilidade de ter de sair para amamentar durante a aula, o que de fato ocorreu algumas vezes sem que tenha havido qualquer problema. Fiz os trabalhos finais durante as sonecas da florzinha, que nesse início de vida ocorriam com frequência. Foi enquanto eu cumpria os créditos que Luiza iniciou a alimentação complementar, sua primeira papinha salgada foi saboreada na cozinha do Instituto, que havia sido preparada ainda de manhã e levada bem protegida numa bolsa térmica (não tinha desculpa para não ter uma alimentação de qualidade né?).
Bem, para resumir a história que é longa: enquanto não tive condições de escrever artigos ou capítulos da minha tese, aproveitei para discutir os resultados da minha dissertação de mestrado, participando de inúmeros congressos e tendo sempre a baixinha junto a mim. Ela – e seu papai – sempre estiveram comigo, o que também funcionou como um estímulo para continuar a carreira acadêmica, que de fato não é fácil. Nessas ocasiões conheci muita gente bacana e pude aprofundar minhas hipóteses iniciais do trabalho que agora desenvolvo.
Quando a baixinha demanda muita atenção ou dorme pouco e não consigo fazer absolutamente nada, não me cobro demasiadamente: sei que terei tempo para fazer o que é preciso. Quando os prazos apertam, as madrugadas servem para adiantar os trabalhos.
Tudo isso para dizer: sim, é possível conciliar maternidade e pós-graduação. É difícil, desgastante, mas extremamente compensador, pela certeza de estar presente nos momentos mais fundamentais da infância da minha filha e pelo prazer de fazer o que se gosta!


Marcia Strappazon

Eu sou outra mãe que tenho emprego público 8h/dia e que até há poucos dias não permitia redução de jornada. (…) Eu fui uma das que foi atrás de mudar a situação. 8h/dia longe do meu bebê (1a e 10m) é demais!! Enfim, fiz todo o caminho para entrar num programa de mestrado depois de 10 anos formada e ainda lutei para conseguir liberação do serviço, com remuneração, já que meu projeto é para ajudar no meu trabalho. Consegui tudo, fui aprovada, liberada, e as aulas hão de começar dia 6/3. Fiquei muito feliz, mas também um tanto decepcionada. Feliz porque seria uma alternativa às 8h/dia obrigatórias, feliz por voltar a estudar e por um projeto bom de verdade. Decepcionada por terem liberado a redução de jornada (bem agora! isso porque tirando licença do serviço sei que sobrecarrego os colegas), porque esse curso é a 100 km de onde moro, então passarei pelo menos 2 dias inteiros longe do pequeno, e um tanto triste também com a realidade da academia que já me irrita um bocado, nessa pira de quantidade em detrimento de qualidade, pensamentos arcaicos, pressões injustificadas, machismo, segregação e por aí vai… Isso que é um programa interdisciplinar!! Enfim, todos querem que eu vá em frente e faça o mestrado. Ah, conto com uma ‘super equipe’ para me ajudar. Empregada pra casa e comida e duas mulheres maravilhosas para brincar e cuidar do filhote (meio período cada – salário integral, porque eu acredito de verdade que as pessoas deveriam ter tempo para suas vidas!). Pois então, acredito que tudo depende de cada família, cada pessoa, cada bebê… Acredito que todos se adaptam, mas que temos sempre que avaliar o que é mais benéfico para a turma toda…”

Julia Terra

Sou Julia Terra, mãe do pequeno Caetano Terra, que possui hoje um ano e oito meses de existência nesse mundo. Sou professora, dançarina e atualmente estou cursando meu doutorado em educação na Universidade Federal de Santa Catarina. Engravidei quando defendia minha dissertação de mestrado na mesma instituição. Logo após, voltei a lecionar aulas na Prefeitura Municipal de Florianópolis, em instituições de educação infantil. Tive meu bebê, saí para minha licença e o retorno ao trabalho, então, ficou sendo um pesadelo. Não conseguia imaginar passar oito horas diárias longe do pequeno, sem acompanhar o seu dia-a-dia. Foram cerca de três meses de loucura total, de estoques de leite materno, de muitos choros, de leite secando, em suma, de total desespero. Antes do Caetano nem pensava em retornar para o mundo acadêmico, mas confesso que sempre amei a pesquisa e tudo que envolvia um pensar a arte como projeto de formação. No entanto, meu receio era se conseguiria ou não uma bolsa de estudos. Caetano nesse tempo tinha seus cinco meses, quando eu tomei a decisão de tentar o doutorado, galgar uma bolsa e ficar com ele. Minha mãe, então, deslocou-se de outra cidade para ficar um mês comigo a fim de eu poder desenhar o projeto de doutorado. Esse era meu foco, sabia que lá estava uma possibilidade de poder conciliar estudos e maternidade sem ter que me ausentar diariamente. Fiz a prova e, assim, conquistamos uma vaga. Fui contemplada desde o início com uma bolsa do CNPq, o que me confortou o coração, pensei “vou poder ficar meus quatro anos com o pequeno”. Eis que não sabia o que me esperava: uma rotina de leituras intensas, disciplinas, proficiência, enfim, tudo chegou como um batalhão de coisas por fazer. Digo por fazer, porque os meus seis primeiros meses foram de muitas dificuldades, não conseguia conciliar nada, era uma adaptação forçada e dificultosa. Em desespero total, encontrei muitas mães que me acolheram e me ensinaram que era possível administrar, que eu não era sozinha, que bastava acreditar e ir colocando os sonhos em prática. Ali, percebi que estava no lugar certo, que tinha que estar onde estava.  Para enfrentar isso, foi preciso então mudar o foco: tornar o peso mais leve, dançar mais com as rotinas diárias e com os afazeres acadêmicos. Dentre as mensagens que mais levei comigo: “você não é a única que passa por isso”, “o pouco tempo que você terá fará muito”, “estabeleça prioridades”, “as mães tendem a levar melhor o mundo acadêmico sem muito estresses”, “escreva a tese com prazer”,  “encontre o seu desejo e deixe fluir”…
Entro agora para o meu segundo ano e o que posso dizer? Meu filhote tem um ano e oito meses, numa fase de muita energia que mal posso  “piscar” . 
Além disso, não tenho empregada e nem babá. Conto muito com a ajuda de vários: da minha sogra que me auxilia nos finais de semana; da minha mãe que, se precisar, desloca-se de outra cidade e me ajuda – ela muitas vezes, ficou comigo por longos períodos para me auxiliar a cumprir trabalhos, estudar para prova, ajudando no que pode. Mas, sobretudo, tenho a parceria do marido. Ele e eu nos dividimos como podemos, ele trabalha três vezes por semana, ou seja, nos outros dois dias a gente se reveza (normalmente são os dias de disciplinas na universidade), participa muito nos afazeres diários com o pequeno e com a casa. Diante disso, foram as madrugadas que escolhi para trabalhar (ainda em adaptação extrema, já que nunca fui muito de estudar nesse período). Começo lá pelas 23 da noite e vou encerrar lá pelas 5 da manhã. Minha maior dificuldade hoje: interrupções por conta da mamada e os sonos que precisam ser driblados. Caetano hoje acorda lá pelas 9 da manhã. O que tenho feito também é dormir junto no período da tarde. Confesso que não é fácil, mas estou ficando alegre de poder vê-lo crescer com a gente, feliz, sereno e tranquilo. Tudo o que me conforta é saber que o meu sonho de acompanhá-lo dia-a-dia está acontecendo, que mesmo com alguns empasses, estamos conseguindo administrar uma educação, um envolvimento que sempre projetamos. Sei que toda certeza é mutável conforme a situação, mas hoje posso dizer que estou no lugar onde deveria estar, fazendo o que deveria fazer, com pessoas parceira, com inúmeros sonhos!
 

(depoimentos escritos em janeiro de 2013)

E a minha experiência…

Faço hoje meu segundo doutorado. Estou no segundo ano do doutorado em Saúde Coletiva. Estava no sexto mês de um pós doutorado quando decidi mudar de área e recomeçar. Sofri muito naquela época, muito mesmo, porque precisava me ausentar cerca de 6 horas por dia tendo um bebezinho em casa. Acordava umas quatro vezes durante a noite para amamentar, levantava às 6 da manhã, às 7:30 já estava lá, trabalhava direto até as 14 horas e voltava correndo para amamentar. Muitas vezes não almoçava, muitas vezes chorava por estar sem minha filha – que tinha entre 6 e 11 meses quando tudo isso aconteceu – chorava por não poder amamentar quando meu corpo indicava que era hora, sofria por viver uma vida com a qual eu não concordava e por não desejar aquele tipo de criação para ela. Foi muito difícil ficar sem ela. Mas – hoje sei – esse não foi o pior. Pior foi ficar sem ela para fazer algo com o qual eu já não me identificava, que não via mais sentido, que não me estimulava nem me motivava. Então, quando recomecei, tudo mudou. Delineei todo meu projeto e atividades acadêmicas de forma a poder estar com ela o máximo de tempo possível, porque vê-la crescer e estar presente era meu objetivo maior, embora minha nova formação seja extremamente importante para mim. Para conseguir dar conta de tudo que tenho que fazer – e é realmente muita coisa, porque estou envolvida em diferentes atividades – algumas coisas são fundamentais. Tenho um orientador muito compreensivo, que me dá liberdade para organizar minha vida acadêmica da maneira como acho melhor, que confia em mim e não exige que eu esteja na universidade apenas para cumprir tabela. Isso acontece com muitos alunos de pós, a gente sabe… Precisam estar presentes como para bater ponto, embora pudessem estar estudando em casa. Muitas vezes, passam horas apenas batendo papo na sala ou no laboratório, já que são obrigados por seus orientadores a se comportarem como funcionários, embora nenhuma legislação trabalhista os ampare. Mão de obra barata, muitas vezes super explorada, pouco valorizada e sem amparo trabalhista legal. Gente bem formada que precisa se sujeitar a esse tipo de coisa. Não vivi isso nem no primeiro doutorado, pois minha antiga orientadora também nos dava liberdade para organizar nossas atividades, mas conheci muita gente que viveu. Hoje, estudo em casa, indo à universidade apenas para as disciplinas que escolho fazer e para eventuais reuniões. Quando preciso me reunir com meu orientador, ou marcamos uma hora possível para os dois em sua sala, ou conciliamos com nossas rotinas familiares. Já discutimos muita coisa importante em reunião em sua casa, junto com sua família e minha filha. Escolho disciplinas que realmente irão me ajudar na pesquisa. Estudo durante as madrugadas, pelo menos um pouco por noite. Minha filha tem dois anos e oito meses e não é possível estudar durante o dia, com ela correndo, cantando, pulando e brincando como sempre faz. Então o dia eu deixo para estar com ela, organizar a casa, cuidar das outras iniciativas nas quais me envolvo, organizar ações, sair com ela e outras coisas menos teóricas. E vou embora madrugada adentro quando preciso ler e escrever. Minha filha não acorda cedo e, para que eu possa descansar um pouco mais, meu marido cuida dela assim que ela acorda. O Skype, o e-mail e o Facebook são meus aliados poderosos de trabalho: é por eles que encontro todo mundo com quem preciso encontrar para fazer com que a pesquisa ande. Muitas vezes me sinto cansada com essa rotina maluca. Mas não abro mão dela. Sei como é estar sem minha filha e não desejo mais isso. Hoje me sinto muito feliz ao me ver construindo uma nova carreira enquanto crio minha pequena da maneira que acredito. Não temos auxiliar doméstico nem familiares que possam nos ajudar. Então mantemos as coisas organizadas juntos. Não é uma vida muito convencional, mas também não me importo muito com convenções. De tudo isso, a única certeza que tenho é: para conseguir, é preciso AMAR O QUE SE FAZ. É preciso identificação total entre seus valores e aquilo que você pesquisa. Quando você gosta muito do que faz, consegue driblar as dificuldades. Hoje, sou completamente apaixonada pelo que pesquiso, pelas disciplinas que curso. Tenho a grande alegria de dizer que vivo intensamente esses dois amores profundos: minha filha e minha nova carreira. Sem precisar sacrificar um em detrimento do outro. Para mim, carreira e maternidade não são excludentes. Não podem ser. A foto acima é uma das minhas favoritas: lá está Clara, minha filha, à frente de uma sala cheia de gente, no Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, em novembro de 2012, pouco antes de apresentarmos pela primeira vez o documentário Violência Obstétrica – A Voz das Brasileiras. E se tem uma coisa que me deixa orgulhosa, é ela se despedir de mim na porta do Centro de Ciências da Saúde, dizendo: “Vai, mãe, vai pra sua escolinha. Eu te amo.“, sabendo me terá de volta dentro de três horas. Hoje, não sei precisar com certeza onde terminam minhas atividades como pós-graduanda e começam minhas atividades como mãe. Está tudo bem integrado. Estou muito feliz assim. E se tem uma coisa que eu desejo é que as jovens mães cientistas que, como eu, estão construindo uma nova carreira, também encontrem seu caminho do meio. 

Acompanhe aqui o que tantas mulheres também estão dizendo sobre suas realidades como pós-graduandas e mães.

Leave a Reply