Do nada, ela começou a chorar. Logo após o almoço. Um choro muito sentido, com lágrimas
escorrendo.
Então eu digo:
“Filha, você está com sono. Não será melhor dar uma descansada lá no quarto?”
“Acho que sim, mãe…”
Como se o reconhecimento da sua própria condição, por si só, já não fosse suficiente para me espantar, ela simplesmente caminha em direção ao quarto e se deita.
Vou até lá para fechar uma das persianas, tirar o sapatinho, aconchegá-la e ouço:
“Eu já sei, mãe. Já sei dormir sozinha”.
Sim, ela já sabe…
Essa semana, perguntou-me se ela tinha um quarto de dormir. Um quarto da Clara.
Então, agora, é hora de arrumar um quartinho só para ela.
Até agora, eu apenas havia escrito sobre isso, sobre como as crianças criadas em quartos compartilhados adquiriam sua própria independência e, sozinhas, buscavam seus espaços, ao contrário do que tantas pessoas pouco informadas acreditam, quando dizem que criança criada juntinho nunca vai querer deixar os pais. Escrevi isso inspirada por tantas experiências de pessoas próximas a mim e por tantas leituras esclarecedoras e coerentes sobre criação com apego.
Escrever é uma coisa.
Teorizar é uma coisa.
Viver é muito outra…
A mim, só uma coisa importa: que ela cresça assim, segura, saudável, sabendo quem ela tem por perto e quem se preocupa com a maneira como ela vai crescer e se formar como gente ativa no mundo.
Todos os caminhos que eu percorrer serão escolhidos pensando nisso: que minha filha cresça segura, confiante e cercada por muito amor.
Porque, afinal, é isso o que ela também me dá. Porque, afinal, é nisso que eu acredito. Se eu desejo que o mundo seja diferente, vejo nas crianças a semente disso. Elas precisam ser criadas com amor e presença.
E se existe alguém que considera isso um deslumbramento inspirado por uma crença mítica na maternidade, algo que desvie uma mulher de sua consciência sobre si própria, seus direitos e seu lugar no mundo, e que é capaz de reduzi-la unicamente ao papel de mãe – que considera secundário, inferior e pejorativo -, substituindo seu papel de cidadã capaz de ajudar a promover a mudança do mundo, de três uma: ou não sabe o que é ser mãe, ou não soube o que é ter mãe ou, no fundo no fundo, ao contrário do que diz, acha que mulher é um ser incompetente que não é capaz de se dedicar verdadeiramente a uma causa sem abrir mão de criar seus filhos com proximidade, afeto, respeito e presença.
E a mim nenhum pensamento parece tão machista quanto esse.
Sou mãe, extremamente orgulhosa da filha que tenho, apaixonada pela maternidade, extraindo de mim o que tenho e o que não tenho para que ela possa ser feliz e ter uma família bacana por perto, escrevo um blog sobre maternidade, mantenho uma página no Facebook acessada por milhares de pessoas, tenho uma coruja tatuada no braço esquerdo e a Graúna do Henfil no braço direito, deixei uma vida já bem conhecida em prol do que acredito, que é uma causa justa, e digo: o feminismo me representa.
A maternidade me representa.
Gente estagnada, com pensamento arcaico e reacionário… não, esse povo não me representa. Na verdade, são esses os que procuro combater.

*Achei que nunca viveria para ver um feminismo reacionário, simplesmente porque os vejo como conceitos absolutamente excludentes.

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